*Por Osmar Gomes dos Santos
Há pouco mais de 400 anos, quando por aqui aportaram, os franceses não imaginavam os impactos que sua invasão traria sobre estas terras. É verdade que pouco restou como herança dos cerca de três anos que aqui estiveram: um forte, as Leis Fundamentais e muitas histórias para posteridade.
No entanto, a invasão francesa trouxe um grande alerta para os colonizadores portugueses, que se viram obrigados a estabelecer estratégias de ocupação do solo maranhense, especialmente pela posição geográfica da ilha de Upaon-Açu.
O projeto lusitano colocado em execução possibilitou a consolidação de São Luís como cidade. O porto foi estruturado, ruas abertas e pavimentadas e vilas foram edificadas. O século XVIII testemunhou a expansão da cidade e a construção do conjunto arquitetônico que hoje conhecemos.
Arquitetura traçada em um projeto que virou marco da colonização, desenhado pelo engenheiro português Francisco de Mesquita. Paredes que guardam acontecimentos importantes de famílias tradicionais, mercados de escravos e azulejos que observaram os ir e vir de várias gerações.
Pedras de cantaria vindas de além-mar, azulejos portugueses, telhados com eira, beira e tribeira, portões, janelas, solares, sobrados. Recortes peculiares marcaram um estilo próprio dos nossos casarões coloniais, cuja história se funde aos acontecimentos sociais e econômicos.
Patrimônio Mundial da Humanidade, um dos conjuntos arquitetônicos de arquitetura portuguesa fora de Portugal, atravessou quase quatro séculos e agora luta contra a omissão humana diante do efeito inexorável do tempo.
Imponentes no período áureo, testemunhas de um passado em que o Maranhão marcou o cenário econômico dos mais importantes do Brasil, os casarões atravessaram a história e hoje agonizam pelo direito de se manter de pé.
Abandonados, nossos casarões deixaram de ser painéis para fotografias de turistas de todo o mundo e gradativamente se transformam em cenário de invasões, depredação, ocupação irregular e mesmo aglomeração para uso de entorpecentes. A chuva e o sol provocam efeitos igualmente devastadores.
Por falar em intempéries, o período chuvoso é ainda mais danoso, oportunidade em que se assistem aos belos telhados, sobrados, paredes e até os casarões por inteiro irem ao chão. Patrimônio único, cada construção tem sua própria história, que se perde em meio a escombros e que jamais voltará.
Espaço onde funcionaram e ainda funcionam importantes instituições públicas. Cenário de poemas e canções que embalaram os mais diversos ritmos, passando pelo lírico, pelo reggae e chegando às letras das manifestações culturais de nosso rico folclore.
Se pudesse comparar ao corpo humano doente, eu diria que nosso, tão famoso mundo afora, projeto reviver, agora, encontra-se na cama de uma UTI.
Reflexo direto é sentido na autoestima do seu povo, no esquecimento de acontecimentos dos mais importantes da história brasileira, na economia movida por um turismo que parece não alavancar. Na contramão de levantamentos rasos divulgados, que tratam de intenção de pessoas visitarem nossa cidade, vemos números pouco expressivos em relação a outras capitais.
A atual situação requer medidas urgentes e passa pela instituição de um programa macro, que envolva revitalização, cessão de uso, preservação. Feito isso, realizar a promoção da capital que é um dos berços da civilização europeia em terra sulamericana.
Promover o turismo, recepcionar bem nossos visitantes, garantir a segurança e bem-estar das pessoas e entregar uma experiência única, baseada em nossas tradições. Proposta como essa contribui no resgate e valorização de nosso passado, gera emprego e renda no presente e assegura um futuro melhor para todos.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.