*Por Osmar Gomes dos Santos
Historicamente a mulher precisou de esforços redobrados para alcançar alguma posição na sociedade. Constituir-se cidadã, digna de direitos, de lugar de fala e representação não foi tarefa fácil, tampouco mera concessão vinda de uma sociedade machista e conservadora.
Papel modesto na vida social e reservado a afazeres domésticos, foram séculos sob o julgo masculino e a pecha de ser imprestável para diversas atividades da vida em sociedade. Algumas tarefas, apenas homens estavam, “por natureza”, capacitados. Por óbvio, uma natureza apenas sua, da própria ignorância.
No Brasil não foi diferente. Sobre a mulher na política, especialmente votar e ser votada, isso só se consumou enquanto direito em 1932, após intensa luta de movimentos feministas, tendo como maior expoente a conhecida Bertha Lutz, que dá nome a um dos mais importantes prêmios nacionais de reconhecimento à luta em defesa dos direitos da mulher.
O implicitamente citado Código de 1932, diga-se, apesar de prever a condição de votar e ser votada, ainda condicionava a mulher a uma posição subalterna ao homem. As casadas precisavam de aval do marido, enquanto viúvas e solteiras somente exerciam seu direito político se comprovassem renda própria. Condições derrubadas com o novo Código de 1934.
Estes tempos ficaram para trás. Avançamos a um estágio civilizatório que, se não pela mera vontade humana, diga-se: do homem, evoluiu com a força feminina traduzida em normas que garantem inclusão, paridade, participação. Tal qual ainda hoje se faz.
Nesse sentido, as normas são mais que bem-vindas. São dispositivos recepcionados para assegurar o equilíbrio das relações humanas, que não advém com a simples vontade daqueles que detém (ou detinham) o privilégio e o monopólio do controle social. Neste caso, o homem.
Bom que se diga que em uma família equilibrada não existe um cabeça. Mulheres e homens – ou seja, lá qual for a composição conjugal em um universo familiar tão plural e diverso quanto o atual – dividem responsabilidades igualitariamente. Assim é e deve ser, também, na vida social.
Avançamos desde aquele 1932, mas parece que ainda temos um caminho a percorrer para alcançar o propósito de uma sociedade justa e igualitária, preconizada pela nossa Constituição Federal de 1988. Em qualquer que seja o código, na lei humana ou naquela considerada divina, somos todos e todas iguais, não havendo que se falar em submissão.
Obviamente que em uma sociedade plural tenhamos que agir com tolerância e compreensão em relação às ideias opostas. É em cima do conflito de ideias que se formam as unidades que trazem equilíbrio. Mas é preciso que tenhamos cuidados com os extremos, que não condiz com o jogo democrático, senão com a anulação do outro.
Em um contexto ainda com tanta violência, em que mulheres são assediadas, violentadas, assassinadas, é preciso pesar as palavras, principalmente a partir das posições ocupadas na sociedade, seja enquanto pessoas públicas ou agentes do Estado investidos nas mais diferentes funções.
Em tempo, é bom que se diga: as normas falam por si, mas são vividas e praticadas por homens e mulheres, cotidianamente. Vivamos nossa rica legislação, sobretudo, aquelas que nos permitiram olhar uns às outras como iguais.
Osmar Gomes dos Santos. Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.