Somos seres essencialmente políticos. Aristóteles já fazia essa afirmação há milênios, a partir da reflexão sobre a sociabilidade, processo próprio das relações entre os humanos. Está em todos, indistintamente, visto que toda nossa forma de se relacionar com o próximo envolve articulação política, ou como dizemos em bom português: jogo de cintura.
O filósofo grego defendia que o homem era, por natureza, um animal político. Segundo ele, a inserção ao meio social acontece na família, que lhe garante sobrevivência, educação e proteção. Mas é quando este sai para a sociedade que sua realização se torna plena, uma vez que por meio de suas ações, no contato com o outro, tem a oportunidade de construir uma sociedade justa.
Nada mais verdadeiro, visto que usamos da retórica e da eloquência cotidianamente para defender pontos de vista, convencer, conquistar, construir relacionamentos e sobreviver como ser social. Tudo política em seu estado mais puro.
Mas quando se diz “homem”, naturalmente não falamos de gênero e sim do ser humano, animal bípede da ordem dos primatas e que pertence à espécie homo sapiens, portanto, carregado de racionalidade. Assim, é, naturalmente, um espaço também extensivo à mulher.
A política enquanto gestão da atividade estatal e político-partidária, no entanto, foi historicamente algo reservado aos homens. Em antigas sociedades, orientais ou ocidentais, a figura do homem, em regra, se sobrepôs ao da mulher no dever/direito de governar.
Mesmo no Brasil, nação vista como “jovem”, o modus operandi persistiu por séculos, com poucas mulheres figurando em papel de destaque político na sociedade.
A ruptura com o regime monárquico, no fim do século XIX trouxe novos ares para a administração estatal, mas a concepção de igualdade ficou apenas no idealismo de papel. A ascensão feminina na política ainda demoraria um pouco mais para ocorrer.
Por longos anos sequer puderam votar, quiçá ser escolhida na condição de representante do povo. Provavelmente reflexo de uma tradição patriarcal, que tinha no homem a figura central da família, logo da sociedade e da coisa pública.
Veio do Rio Grande do Norte a primeira mulher eleita para dirigir um município. Luíza Soriano Teixeira fora escolhida em sufrágio no ano de 1928, em virtude de uma lei local que garantia à mulher o direito de se candidatar. A primeira congressista chegaria a uma cadeira apenas em 1934, Carlota Pereira de Queiroz, representando o Estado de São Paulo na então Constituinte.
Naquela época, um decreto presidencial de Getúlio Vargas assegurou a participação da mulher na política, mas, apesar de aparente consolidação de seu espaço, a mesma ainda enfrentava uma série de restrições. Se casadas, deveriam ter autorização expressa do marido; já as viúvas e solteiras tinham de comprovar renda própria. Somente com o Código Eleitoral de 1946 é que essas limitações deixaram de existir.
Desde então tivemos avanços significativos, com a mulher ocupando cada vez mais o protagonismo político. O Maranhão, por exemplo, tem lugar e destaque nesta trajetória, já que o Estado foi o primeiro da federação a ter, eleita pelo povo, uma governadora. Posteriormente a nação elegeu uma “presidenta”, posto maior possibilitado pelo sistema representativo.
O sufrágio universal já não é novidade, mas hoje é possível verificar normas que garantem a participação da mulher na política, a exemplo do percentual mínimo de candidatas por partido em cada novo pleito. Na mesma esteira está o regramento que assegura recursos do fundo partidário para que candidatas custeiem suas campanhas.
Diferentemente de um século atrás, vimos país afora centenas de mulheres buscando cada vez mais ocupar esse espaço.
A mulher buscou sua autoafirmação em todos os campos e na política não poderia ser diferente.
Este ano o Brasil terá novas eleições municipais. Para o povo, mais uma oportunidade de ouvir propostas e escolher aquelas que melhor representam a vontade de mudança. Para as mulheres, uma página em branco para que consolidem mais um capítulo de conquista e de afirmação à frente da coisa pública.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras