*Por Osmar Gomes dos Santos
Ouço muita reclamação acerca da desvalorização do Real frente a outras moedas e até mesmo sobre inflação, que é algo natural a toda economia. Não tenho pretensão de tirar a razão de alguns que bravejam, com suas devidas razões, mas há que se lembrar de um tempo bem menos tranquilo que o atual.
Esta semana comemoramos 30 anos de implantação do Plano Real. Importante falar em comemoração, com toda semântica que o termo possa possibilitar, uma vez que retirou a nação das sombras inflacionárias e de um cenário de total insegurança econômica.
O contexto remetia ao completo descontrole da inflação e uma forte crise econômica, ainda com raízes no regime militar. O valor do dinheiro era algo volátil. De forma didática, o mesmo dinheiro que pela manhã comprava dois pães, pela tarde comprava apenas um.
O valor da moeda derretia, evaporava, com o passar das horas. Foi período da chamada hiperinflação, que se arrastou pela década de 1980 e alcançou o ano de 1993. Neste último ano, por exemplo, o Brasil chegou a uma inflação acumulada superior a 2.000%.
Para efeitos de comparação, um estudo no qual tive acesso, mostrou que em junho de 94 a inflação bateu 47,43%. Para entender os efeitos práticos, significa dizer que um carro popular comprado por R$ 35 mil, após um mês ele passaria a valer mais de R$ 50 mil.
Nesse cenário, o comércio remarcava os preços das mercadorias duas ou até três vezes ao dia, com valor sempre para mais. A fim de garantir a comida na mesa, famílias precisavam gastar a renda praticamente toda, encher a dispensa e os freezers para o mês inteiro. Caso contrário, o salário se desvalorizava e pouco se comprava com o passar dos dias.
Eis que um intenso trabalho da equipe econômica do então presidente Itamar Franco, chefiada pelo ministro da Fazendo Fernando Henrique Cardoso, chega a uma fórmula que seria capaz de devolver a paz na economia. Em 30 de junho de 1994, após um curto período do Cruzeiro Real, nasce o Plano Real.
O Real surgiu como um grande desafio: garantir a estabilidade da moeda para controlar a inflação, após sucessivos fracassos de planos econômicos em governos anteriores (Cruzeiro, Cruzado, Cruzado Novo e Cruzeiro). A alternativa de congelar os preços, vista no governo Sarney, se mostrou pouco eficiente e era um ponto de cuidado a ser evitado.
Assim, o Plano foi instituído por etapas: ajuste Fiscal, equilibrando as contas públicas; Implementação da Unidade Real de Valor (URV), uma moeda virtual atrelada à cotação do dólar comercial no dia anterior; e o Real, convertendo o Cruzeiro Real (CR$) para Real (R$). Esses fatores que garantiram robustez para que no médio e longo prazo a economia pudesse se estabelecer, garantindo o fortalecimento da indústria nacional e a geração de emprego e renda.
Depois da criação do Plano Real, a inflação no país conseguiu se manter relativamente controlada. Em 1996 o índice foi de 9,33% e, desde então, poucas vezes ultrapassou a casa dos 10 por cento ao ano.
Para se ter ideia, de junho de 2023 a maio de 2024, o IPCA ficou em 3,93%. Os anos de total incerteza ficaram para trás, mas, porém, todavia, entretanto, nossa história nos ensinou que não podemos descuidar e todo esforço é necessário para garantir a manutenção da estabilidade alcançada. Vida longa ao Real!
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.