Esta semana o Brasil ficou um pouco mais triste com a perda do renomado jurista, escritor e sociólogo Helio Jaguaribe. A partida serena, em sua residência em Copacabana – Zona Sul do Rio de Janeiro –, contrasta paradoxalmente com a vida ativa que levava. Com um pensamento e uma obra de vanguarda, Jaguaribe leu como poucos na história do Brasil e propôs, com maestria peculiar, caminhos possíveis para o desenvolvimento da nação.
O intelectual foi o nono a ocupar a Cadeira nº. 11 da Academia Brasileira de Letras (ABL), quando chegou em 2005. Como por um enredo harmonioso do destino, sucedeu o saudoso Celso Furtado, outro renomado estudioso dos problemas do Brasil. Formado em Direito, dedicou mais de 6 décadas à academia, dando importantes contribuições ao país, notadamente na área das Ciências Sociais.
Pensador seminal, estava sempre um passo a frente de seu tempo. Na medida em que defendia a reorganização do sistema político e democrático brasileiro, suas ideias alimentaram debates e possibilitaram alicerçar diretrizes capazes de funcionar como engrenagem ao progresso do país.
Mas Jaguaribe foi, sobretudo, um homem de ação, buscando interpretar o país e propor soluções concretas para os mais diversos problemas. Foi assim que surgiu, ainda na década de 1950, o importante Instituto Superior de Estudos Brasileiro – Iseb.
Entusiasta, otimista e audacioso em suas linhas de pensamento, ousou olhar adiante e vislumbrar nossa nação mergulhada em problemas na última virada de século. Não se limitou em apontar os nós que amarram o progresso do Brasil, destacando soluções concretas e necessárias em seu artigo “No Limiar do Século XIX”.
Ao falar dos entraves brasileiros, ele foi tão nostálgico, tão presente e tão futurista ao afirmar que somente a educação pode transformar a nação. Atrevo-me a cometer um grande pecado ao desfigurar tão importante escrito, mas faço aqui dois recortes e os transcrevo para demonstrar o quão intenso, pujante e cheio de vida era seu pensamento.
…“No caso do Brasil, esses problemas podem ser sumariados na tríade: 1) integração nacional e continental; 2) desenvolvimento geral; e 3) modernização tecnológica”…
…“O caso do Brasil, embora requeira um equacionamento difícil e ainda mais difíceis condições para sua solução, é comparativamente mais simples. O grande problema do Brasil é, em primeiro lugar, o de sua integração social e, depois, em condições de relativamente mais fácil execução, o de sua integração regional”…
Nesse que considero um escrito de grande relevância e que traz importantes apontamentos para o futuro da nação, Jaguaribe defende com maestria que o caminho para a nação consiste no binômio educação e desenvolvimento. Uma educação com um nível de qualidade elevada, capaz de romper as correntes que prendem o país no poço do subdesenvolvimento.
Renegado em tempos de ditadura militar – como tantas outras mentes brilhantes – foi compartilhar seu vasto conhecimento nos Estados Unidos, onde permaneceu de 1964 a 1969, tendo lecionado nas respeitadas universidades de Harvard, Stanford e Massachusets. Também recebeu títulos de Doutor Honoris Causa em diversas instituições de estudos superiores em razão de sua grandiosa contribuição para as Ciências Sociais e estudos latino-americanos, além de várias outras condecorações.
Sua vigilante obra deixou uma marca indelével na literatura crítica brasileira, a exemplo, também, dos escritos “A dependência político-econômica da América Latina” e “Um estudo crítico da história”. Assim como tantas outras, essas obras tratam da realidade nua e crua – tal como ela é – e o que pode ser alterado mediante ações concretas, seja no campo político ou social.
Sua morte, sem dúvidas, confirma o quão implacável é o tempo e inexorável é o destino ao qual todos estamos fadados a encontrar. Mas em vida o seu legado se fez eterno. Jaguaribe deixa este plano para se tornar definitivamente um imortal a altura da sua nação e do seu povo, com os quais compartilhou seus ensinamentos e dedicou uma vida de estudos.
Osmar Gomes dos Santos
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.