O dia 12 de junho, embora para muitos seja uma data para comemorar a união, o amor entre duas pessoas, compartilhar carícias, presentes e juras de amor eterno, também é uma data que, a cada ano, marca uma triste estatística que o Brasil ainda não conseguiu superar: o trabalho infantil. Estudos recentes mostram que o país ainda está longe de acabar com essa prática que tolhe os sonhos da nação.
No Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, também celebrado no 12 de junho, o Brasil não tem o que comemorar. Os dados ainda são estarrecedores, oriundos das mais diversas fontes que lidam com a problemática, a exemplo de organismos internacionais, de entidades da sociedade civil organizada, de órgãos públicos ligados ao combate da exploração da mão de obra infantil.
Pesquisa divulgada esta semana revela que o Maranhão, por exemplo, ocupa o quinto lugar no Brasil na exploração do trabalho infantil e coloca a problemática como obstáculo a ser vencido por todos os estados da federação. Embora a divulgação seja recente, os dados são de 2016, obtidos a partir da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (Pnad/IBGE).
Estudos mais recentes, porém, divulgados pelo Governo do Estado, com base em informações do Ministério da Cidadania, apontam avanços significativos nos últimos cinco anos. Enquanto em 2015 foram registrados casos de trabalho infantil em mais de 18 mil famílias maranhenses inseridas no CadÚnico, no ano de 2020 esse número caiu para pouco mais de 2 mil famílias.
Independente dos números – se houve ou não avanços aqui ou acolá, que, por óbvio devem ser reconhecidos – defendo a linha de que determinados dados não podem ser simplesmente comemorados. Não se pode celebrar enquanto milhares de outras pessoas ainda sofrem com um problema que deve ser erradicado em todo Brasil.
Como enaltecer, por exemplo, a queda da violência contra mulher, ou contra o negro, ou a redução de homicídios, quando ainda temos milhões de brasileiros sofrendo todo tipo de violência país afora? Comemorar certamente não é a palavra ou a atitude mais adequada. Por outro lado, é necessário exercitar a reflexão sobre as ações que deram certo e aquelas que se mostraram ineficazes para que o problema pudesse ser solucionado por completo.
Como diz o jargão que tomou conta do país e do mundo nas últimas semanas: “todas as vidas importam”. Negros, brancos, mulheres, homens, idosos, jovens, gays, lésbicas, crianças, seres humanos. Todos importam: independente de cor, credo, classe, religião, escolhas. A vida importa. Por que não começar pelas crianças?
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, uma das obras primas legislativas criadas em todo mundo, transmite aos nossos pequeninos um conjunto de dispositivos de que buscam resguardar sua integridade. A norma se funda naquela certeza que todos nós temos e costumamos propagar: as crianças são o futuro da nação.
Em seu Art. 4º, o ECA nos ensina que “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Este dispositivo, em suma, revela exatamente a forma como nós deveríamos cuidar desse futuro. Criança precisa ser criança. E veja que a responsabilidade é de todos – poder público e sociedade – na promoção dos direitos e na garantia do desenvolvimento saudável. Nesse dever cívico, não podemos, os adultos, nos dar direito de ter recreio. Para nós, sim, o trabalho precisa ser incansável.
Mais do que refletir sobre esse dia, é preciso colocar em prática, no dia a dia, ações que possam combater a exploração do trabalho infantil. Denunciar, boicotar serviços e marcas, participar de discussões, conscientizar o próximo são alguns dos caminhos que podemos trilhar nessa longa jornada.
Ainda acha que o problema não é seu? Enquanto você lê este artigo, infelizmente há milhões de crianças trabalhando no mundo, dezenas de milhares no Brasil, milhares no seu estado, centenas em seu município. Muitas delas arregaçando as mangas – algumas em jornadas exaustivas – para garantir que alguns bens de consumo cheguem até sua casa, de alimentos aos modernos eletrônicos. E então?
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras