*Por Osmar Gomes dos Santos
Atire a primeira pedra quem nunca errou. Este ensinamento bíblico deve ser levado conosco em baixo do braço, todos os dias. Ele nos faz lembrar que somos falhos, humanos e, portanto, devemos ser humildes de coração.
Não apontar o dedo ao próximo deveria ser uma prática comum, inserida em nossas condutas diárias. No entanto, não devemos perder a capacidade de nos indignarmos com acontecimentos do cotidiano, notadamente aqueles reprováveis, que trazem dor e sofrimento.
O episódio testemunhado pelo Brasil e o mundo de um procurador agredindo sua colega no ambiente de trabalho é estarrecedor. Segundos que certamente pareceram uma eternidade para a mulher que esteve sob os chutes e pontapés de um indivíduo que podemos chamar, no mínimo, de Covarde. Com C maiúsculo.
A violência contra a mulher é uma pauta que, infelizmente, temos que debater. Enquanto houver uma única mulher sofrendo violência, seja qual for o tipo, precisamos parar e discutir seriamente a problemática.
Mais do que isso, é necessário discutir medidas capazes de punir agressores de mulheres. Daí que se faz importante um amplo diálogo acerca de uma legislação mais dura, proporcional ao tipo de violência cometida.
Tratar a mulher sob socos e pontapés, agride não somente seu corpo, mas também sua alma. Remonta a nossa estrutura social, herança dos colonizadores. A mulher como objeto, carne, sexo, desejo, reprodução.
O lugar que a ela cabia era aquele concedido pelo macho alfa, o seu dono, o provedor. Casos como o da semana, mostram o quão é difícil para alguns homens compreenderem que a mulher se libertou. Mas do que isso, que nunca deveria ter sido acorrentada.
Para muitos ainda é difícil aceitar. Ver a mulher em posição de destaque, dividindo o protagonismo ou mesmo se destacando em seu protagonismo. Isso não é para um homem qualquer, mas para aqueles com H maiúsculo. Diferente daquele mesquinho, que de maiúsculo é apenas o C de Covarde.
Os socos desferidos não são apenas de um Covarde, mas de toda uma parcela da sociedade que ainda subjuga o papel da mulher. Uma parte que não aceita, que ainda vive há séculos de um estágio razoável de civilização.
Um segmento que nega valores, que ataca a honra, que inferioriza a figura da mulher e de parcelas ditas minorias. Ajuda a reproduzir comportamentos hostis, que nos afastam enquanto seres humanos.
Com uma atuação de vanguarda, o Judiciário vem buscando fazer sua parte. Ações estão sendo realizadas de forma permanente, concomitante ao pleno funcionamento da função judicante.
Nessa semana, o Tribunal de Justiça do Maranhão deu mais uma mostra de seu protagonismo perante esse problema social. Um evento de dois dias reuniu autoridades, especialistas e sociedade civil para debater melhorias das políticas públicas de combate à violência contra a mulher.
Mas ainda há muito a ser feito. Somente em 2022 cerca de trinta mulheres já perderam a vida em crimes de feminicídio.
Justificativa não há para atentados como o sofrido pela procuradora. Absolutamente. E não podemos perder a capacidade de nos revoltarmos diante desses fatos, sob pena de fortalecermos uma cultura machista, uma ditadura da testosterona.
Mulheres e homens de bens, uni-vos. Empunhemos a bandeira da paz, da igualdade, da tolerância, do respeito. Para além da cor, classe, idade, sexo. Deixemos para trás, em definitivo, uma cultura da violência que apenas nos afasta. Abaixo os socos e pontapés.
*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Escritor; Cronista; Poeta. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.