A pandemia afetou a vida de milhões de pessoas mundo afora, acarretando um impacto em nível global ainda não visto na história da humanidade. Vidas se perderam, outras foram transformadas, costumes e comportamentos alterados não se sabe até quando.
Nações fecharam fronteiras, governos tiveram que se reinventar, cortando gastos e instituindo políticas assistenciais, ao mesmo tempo em que incentivavam a busca da cura para o mal. Setores primário, secundário e terciário aceleraram o processo de adaptação e as organizações precisaram se reinventar de todas as formas para continuar levando produtos e serviços aos seus públicos.
Na esteira das mudanças, o Judiciário vem consolidando um processo de profunda transformação, avançando significativamente em várias frentes. Tendo a tecnologia como aliada, acelerou sua modernização no último ano, o que marcou, definitivamente, a passagem do papel para as telas de computador e smartphones.
Mas essa atuação e os resultados dela advindos, tal como agora visto com mais pujança, faz parte de um movimento que ganhou força há 17 anos, com o advento da Emenda Constitucional 45/2004, permitindo que o Judiciário saísse de sua “caixa-preta” e pudesse, definitivamente, ter contato com a luz que o guia na consolidação dos direitos e garantias constitucionais.
Hoje, vemos uma Justiça mais atuante, que dialoga com diversos segmentos sociais, das mais altas instituições, ao cidadão dito comum, que representa uma entidade de bairro ou mesmo que bate às portas das unidades judiciárias para requerer algum direito.
Uma Justiça sem preconceitos, que não vê limites geográficos, que transcende fronteiras somente para ouvir o cidadão. Vemos essa atuação no trabalho da Ouvidoria, que está em vários canais de comunicação com a sociedade, que ruma aos mais longínquos municípios para receber reclamações e sugestões de como a Justiça pode avançar.
Da mesma forma são as audiências públicas, presididas por juízes e juízas aos quatro cantos do Estado, para debater temas da ordem do dia de cada municipalidade. É a Justiça em sintonia com o clamor social!
Recentemente, há cerca de uma semana, deparei-me com uma notícia que falava da ação itinerante da Corregedoria Geral da Justiça do Maranhão, por meio de visitas técnicas, em várias comarcas do Estado. Pelas comarcas percorridas e a quilometragem acumulada, certamente um trabalho exaustivo, mas, ao mesmo tempo, gratificante para quem faz a Justiça com a alma.
Na agenda de trabalhos da comitiva, diálogo com membros da magistratura, servidores e delegatários do serviço público, os chamados cartorários. Mais do que acompanhar os serviços do Judiciário, garantir o bom funcionamento das atividades judiciais, entendo que ações como essas consistem em distribuir esperança aos milhões de maranhenses.
Esperança especialmente em razão da retomada das atividades presenciais, com o Judiciário passando uma clara mensagem de que a vida resiste e de que é preciso seguir fazendo justiça. Noutra via, não se pode abandonar as melhorias advindas com a tecnologia. Incorporamos o atendimento a distância, a intimação eletrônica e a audiência virtual, avanços que estão alinhados com a modernidade que vivemos.
A dita itinerância, com a realização das visitas técnicas, repercutiu positivamente e mostrou que a Justiça continua presente, como sempre esteve, e ainda mais forte para atender os reclames sociais.
Sou juiz de carreira e desde então passei a conviver com juízes, desembargadores, corregedores e presidentes que não viviam mais enclausurados em seus gabinetes, mas com um perfil atual onde o Judiciário avançou frente a complexa conjuntura social.
Precisamos, ainda, concentrar esforços em nossas atividades diárias de julgar? Sim. Os gabinetes ainda são nossos redutos. Mas assim como a letra da canção de que o artista tem que ir onde o povo está, saímos de nossas salas para colocar o pé na estrada e materializar a essência de realizar justiça, levando-a a quem precisar.
O Judiciário, hoje, está à frente de políticas públicas, coordena projetos, mobiliza atores, fomenta ações de garantia da terra, da emissão de documentos, da proteção aos mais vulneráveis. Não apenas pelas ditas canetadas, que asseguram direitos em uma lide judicial, mas pelo que o Judiciário faz além da sua função precípua de julgar.
A adoção da agenda 2030, da Organização das Nações Unidades, que pretende transformar o mundo em um lugar melhor para se viver é uma atitude para se aplaudir. Aperfeiçoar a instituição Justiça, para promover serviços, garantir direitos, fomentar a edificação de cidades mais inclusivas e assegurar a paz social estão na pauta permanente do Judiciário moderno.
Vemos esse perfil da Justiça na preocupação com a execução penal, na realização dos mutirões, na luta pela melhoria no cumprimento das penas daqueles que transgrediram a ordem social. Constatamos essa virada, no que posso classificar como uma mudança de perfil de atuação do órgão correcional, que hoje atua para além de punir.
Naturalmente que todo indício de desvio deve ser apurado, assim como as denúncias e reclamações, pois ninguém está acima do bem ou do mal. Mas o diálogo e o acompanhamento permanente proposto, muito contribui para que magistrados, servidores e cartorários possam praticar seus atos com mais segurança, com observância ao compêndio de normativos.
Para isso servem as inspeções e correições. As visitas técnicas, para diálogo, apoio, alinhamento e orientação, a meu ver, vem como uma ferramenta a mais nesse suporte, sobretudo, para aquelas comarcas mais longínquas, cujos relatos dos mais antigos remontam um cenário de pouco contato e diálogo com a Administração superior.
Como membro, alegra-me ver este Judiciário renovado. Vejo atualmente a concretização de um desejo que busquei colocar em prática desde os primeiros anos da magistratura, com a implantação de inúmeros projetos sociais pelas comarcas por onde passei.
Ao longo da história recente, desde a chamada descoberta do Brasil, a Justiça teve contornos dos mais diversos, evoluiu com a sociedade, saiu dos prédios e gabinetes para colocar os pés na estrada. A itinerância, prevista na Carta Constitucional, nunca foi tão bem compreendida e executada como na atual “safra” de magistrados.
O pensamento moderno de que a Justiça é para e com a sociedade tem proporcionado uma atuação de vanguarda que, certamente, elevará o Poder Judiciário a um nível além dos patamares atuais.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras