Noite de sábado, 09 de maio. Exausto, deito para descansar um pouco, corpo e mente. A jornada semanal foi pesada.
Penso em minha mãe. Palavra tão comum ao nosso vocabulário. Na tenra idade, foi uma das primeiras palavras que balbuciei, ainda que com uma pronúncia incorreta, carregada de significado. Aprendi a caminhar e nas primeiras quedas lá está sua mão estendida a me amparar.
Crescia contemplando seu sorriso e sua fé. Aquela escolhida por Deus para realizar o milagre Divino de gerar a vida. Em seu ventre me carregou por nove meses e por anos me protegeu e amou, e ainda ama, incondicionalmente.
Mas cresci. Vejo-me moço, nariz empinado, maioridade batendo à porta. Seus conselhos, quando os escuto, já não são bem-vindos. Suas lamúrias são apenas “exageros”, coisa de tempos passados. O mundo mudou mãe!
Dou preferência às baladas, sair com amigos, curtir uma “vibe” diferente a cada fim de semana. O namoro e as amizades passaram a ter lugar cativo na minha rotina. Era bem mais descolado. Vou deixando minha mãe relegada, esquecida noutro plano, secundário, sem importância.
Já sou independente. Saí de casa e constituí minha própria família. O tempo de menino se foi. Perco-me nas pesadas horas de uma rotina agora dedicada ao trabalho constante. Passei a morar longe e minha mãe já não encontro com tanta frequência.
É um “calma aí” pra cá, “tô sem tempo pra lá”, “quando puder dou uma passadinha” e a relação ficou ainda mais distante. O telefone substituiu o abraço, as redes sociais aposentaram os álbuns de fotos e a reunião da família agora acontece nos aplicativos de mensagem.
Sou muito ocupado e sem tempo. Se na juventude era namoro, viagens, papo no bar e voltinha com os amigos; agora, estou preso em meus afazeres, amarrado às minhas ganâncias mundanas. Para minha ausência, cada vez maior, encontro desculpas das mais esfarrapadas, que na verdade apenas refletem o meu egocentrismo.
E assim acumulando falta de tempo para quem tanto tempo dedicou a mim, veio-me um peso na consciência. Entendi que deveria me dedicar mais e dar mais atenção a minha mãe. De repente, chega uma mensagem que rasga minha alma e me faz entender que já não mais será possível: a mãe se foi, não está mais entre nós, mandaremos notícias do sepultamento.
O telefone toca insistentemente. Acordo. Já é domingo de manhã, o segundo de maio, precisamente sete horas, o alarme insistiu em me despertar. Foi apenas um sonho. Logo passo a mão no aparelho e faço uma ligação. Alô, mãe? Só quero te dizer o quanto te amo!
Em tempos de pandemia, com medidas de isolamento e lockdown anunciadas, lembrei do fato de que este ano, para muitos, excepcionalmente, nesta manhã de domingo não estarão ao lado de suas mães.
Eis aí um grande motivo para refletir o tamanho dela em sua vida. Quantas não foram as vezes que hesitou em ligar, em dar uma passada, ainda que breve, para dar um abraço apertado, olhar nos olhos e expressar o sentimento?
Não deixe que o trabalho te consuma, que a ganancia te cegue, que a vaidade te enalteça. Esse status é a última parada do trem bala antes que o mundo tenha lhe roubado as melhores lembranças que poderia ter daqui a alguns anos.
E aquela visita sempre impossível, por diversos pretextos, para a mãe que mora longe? Ironicamente, você arrumará tempo para quando ela estiver doente em um leito de hospital. Da mesma forma, conseguirá levantar algum dinheiro para comparecer ao seu sepultamento. Tarde demais!
Como bem diz a letra da música sorria e abrace teus pais enquanto estão aqui, que a vida é trem-bala, parceiro, e a gente é só passageiro prestes a partir. Não deixe sua vida descarrilhar.
Hoje é o dia da sua mãe. Daquela que te entregou parte da vida, do tempo, da atenção, do amor e poderia entregar a própria vida. Não importa como a maternidade foi concebida, se por fertilização natural ou reprodução assistida. Ou ainda por uma “fertilização não convencional”, que, ao invés do útero, germinou e aflorou no coração, por ato de amor que culminou na adoção.
O isolamento social que vivemos em meio à crise sanitária pode afastar, mas jamais enfraquecer o laço de amor materno criado entre ela e você. Por força do destino estamos em isolamento. Mas pegue o telefone, ligue, converse, faça chamada de vídeo. E quando tudo isso passar, quando puder sair às ruas escolha os braços dela como o primeiro para o qual correr.
Esse distanciamento talvez sirva para te mostrar algumas verdades, daquelas que machucam no fundo da alma. Serve para perceber o quão importante e significante é a mãe em nossas vidas. Lápides não têm ouvidos. Não deixe para dizer eu te amo quando for tarde.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras