*Por Osmar Gomes dos Santos
Mais uma semana se encerra com a publicação de dados preocupantes sobre o processo de ensino-aprendizagem no Brasil, o que acende um importante alerta e chama a atenção, ou ao menos deveria chamar daqueles que fazem a educação brasileira.
Na semana em que comemoramos o Dia Mundial da Educação (28 de abril), dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), relativos ao ano de 2023, revelaram que apenas 5,2% dos estudantes do 3º ano do ensino médio da rede pública alcançaram um nível de conhecimento considerado adequado em matemática.
Levando-se em conta os comparativos com a série histórica, o resultado aponta um retrocesso de mais de uma década, igualando-se ao quadro de 2011. Para além das comparações, o que se vê, na prática, é muito mais alarmante, distantes de uma educação de qualidade e transformadora.
E o cenário, que já parece sombrio, agrava-se com os dados referentes à língua portuguesa, cujo percentual de estudantes com desempenho minimamente satisfatório é de pouco mais de 32%.
Estamos falando da nossa língua materna, do domínio da gramática, da grafia correta, da capacidade de interpretação que nos permite compreender a dinâmica social em que estamos inseridos.
O levantamento também escancara o quadro de desigualdade: na rede privada, por exemplo, o índice de conhecimento em matemática, na mesma série, sobe para 30,5%, muito acima dos pouco mais de 5% verificados na escola pública.
Esse abismo se torna ainda mais profundo quando os dados são analisados sob o recorte de cor da pele e renda. O estudo apresenta um comparativo referente ao 9º ano do ensino fundamental.
O desempenho indica que a diferença na absorção de conhecimento em língua portuguesa entre estudantes brancos, amarelos, pretos pardos e indígenas saltou de 9,6% para 14,1% entre 2013 e 2023. Em matemática, esse fosso aumentou de 6,2% para 8,6%.
Quanto à renda, em todas as faixas avaliadas, os estudantes mais ricos atingiram níveis significativamente superiores, com uma diferença que ultrapassa 20 pontos percentuais, o que amplia o desafio para quem propõe soluções voltadas à rede pública de ensino.
Os dados falam por si e revelam um recorte temporal. Todavia, o que mais me chama a atenção é o fato de que talvez não possamos nutrir muitas esperanças, levando-se em conta o fator histórico.
Há muito se diz que o Brasil é o “país do futuro”, uma afirmação nascida das propagandas ufanistas promovidas pelo governo durante a ditadura militar. No entanto, quarenta anos após o fim daquele regime, ainda tropeçamos na tabuada e na gramática.
Ainda somos um país com sérios problemas de analfabetismo e por muito tempo, se tentou reduzir com a simples ideia de que a capacidade de assinar o próprio nome já bastaria para deixar alguém de fora dessa condição. Esqueceram-se de que cidadania e dignidade passam, necessariamente, por uma aprendizagem de qualidade nos bancos escolares.
Temos um alto índice de analfabetismo, cerca de 6% da população, e um índice alarmante de analfabetismo funcional, que beira os 30%. Quando transformamos esses percentuais em números absolutos, considerando o tamanho da população, podemos mensurar a real profundidade do problema.
Naturalmente, não cabe a um juiz dizer o que deve ser feito, pois têm especialistas para isso. Entretanto, como cidadão, dentro de um espaço democrático, entendo que o sistema precisa passar por profundas transformações estruturais.
Programas sociais de transferência de renda são importantes, mas as mudanças de base são urgentes: reformulação curricular, revisão de metodologias, melhoria da infraestrutura, qualificação permanente dos docentes, definição e acompanhamento de metas, tanto para as redes de ensino, quanto para os estudantes, são apenas alguns dos caminhos possíveis.
O mundo nos oferece lições diariamente, a exemplo da China e da Coreia do Sul, de que a educação tem o poder de transformar sociedades. No entanto, para que isso ocorra no Brasil, talvez tenha chegado a hora de mudarmos, de forma definitiva, a maneira como enxergamos a educação.
* Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, ALMA – Academia Literária do Maranhão, e AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.