*Por Osmar Gomes dos Santos
Enquanto tivermos uma sociedade que insiste em segregar, tratar com preconceito, indiferença e racismo, seja este enrustido ou escancarado, será necessário falar de pessoas como Vinícius Júnior. Enquanto tiver pessoas que “torcem o nariz” diante desta temática; ou que não passarão deste primeiro parágrafo, faz-se urgente, obrigatório e preciso discorrer sobre o assunto.
Há algumas semanas falei da injustiça feita pela revista France Football, que não entregou a, merecida, bola de ouro para Vini Júnior. Não, necessariamente, a revista, mas aqueles que votaram e deixaram registrado o manifesto de um racismo já enraizado em nossa sociedade, cuja mazela é capaz de enterrar os sonhos e a autoestima de milhões de pessoas.
Hoje, vê Vini levantar o troféu de melhor do mundo entregue pela FIFA é como lavar a alma com o mais puro orgulho. Um brasileiro, preto, favelado, criticado, desacreditado e merecidamente o melhor do mundo no futebol.
O ápice alcançado por Vini, não retrata apenas uma conquista pessoal do atleta; como ele mesmo fez questão de frisar, ao receber o troféu. Carrega consigo o simbolismo e o peso do sonho de milhões de crianças. Os mais íntimos desejos daqueles pequeninos de pés descalços, que aprendem a driblar no asfalto ainda quente, que corre atrás da bola no campo de várzea, no poeirão, onde a ginga se desenvolve e se aprimora.
Sonhos que quando a noite cai adormecem ao som de balas traçantes nas favelas e morros, mas que também estão no castigado sertão, em meio a floresta, nos mais distantes rincões do país e mesmo na zona sul elitizada. Sonhos não têm classe social, não escolhem lugar e não veem fronteiras. No entanto, em se tratando daquelas crianças em posição, digamos, menos favorecidas – ou em nada favorecidas – temos sempre o sentimento de que a vida poderia (ou ainda pode) ganhar contornos outros, não fosse o estudo e o esporte.
Por isso, no lugar em que falta praticamente tudo, muitas vezes a oportunidade de uma vida digna, não podem faltar os sonhos. São eles que permitem esperançar dias melhores. E há quem abdique dos seus próprios sonhos para apostar nos de outrem. Assim, enfatizou Vinícius, ao receber a premiação, pois sua família, seus pais deixaram de viver suas próprias aspirações para acreditar e investir na vontade daquele menino franzino.
A força do esporte é fantástica e dos sonhos também. Eu sou protagonista de um sonho,(vindo da roça, da palafita, machucado pela ditadura), porém tive a ousadia de sonhar …
Marta, os Ronaldos, Romário, Adriano, Rebeca, Izaquias, agora Vinícius Júnior é o responsável por incorporar e representar esses sonhos, não mais esquecidos. E jamais adormecidos!
Sonhos que calam o preconceito, o racismo, a intolerância. O sonho da favela, que, agora, permite pensar em uma sociedade melhor, justa e igualitária.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras e Maranhense de Letras Jurídicas; ALMA – Academia Literária do Maranhão e AMCAL- Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.