*Por Osmar Gomes dos Santos
Para quem crê a vida não acaba — apenas se transforma. Assim afirmava o Papa Francisco, ao dizer que a morte não deve ser vista como o fim da existência, mas como o início de uma jornada transcendental e eterna. Suas palavras traduzem bem a relação íntima com Deus e anunciam o fim material que a todos, inevitavelmente, alcança. Ademais, revelam sua sabedoria e profunda espiritualidade, características de um verdadeiro mensageiro de Deus neste plano terreno.
Mesmo estando tão próximo do divino, jamais deixou de viver sua humanidade, sempre com a humildade que lhe era peculiar. Prestes a se tornar líder da Igreja, José Mario Bergoglio recebeu uma batida no ombro e um conselho: “Não esqueça os pobres”. Foi daí que surgiu a escolha de seu nome papal.
São Francisco de Assis, santo da Igreja Católica, viveu em meio ao luxo proporcionado pela riqueza familiar. Contudo, ao descobrir sua vocação, fez voto de pobreza e fundou a Ordem Franciscana, renovando a Igreja de seu tempo. Inspirado por esse exemplo, Bergoglio adotou o nome Francisco, como sinal de amor e devoção ao próximo — marcas presentes em seus discursos e atitudes.
O Papa Francisco irradiava alegria pela vida e fé no ser humano. Essa postura gerou um efeito imediato na reaproximação de pessoas de todas as idades com a Igreja Católica. Evangelizava com o coração: mais do que palavras, falava por meio de atitudes, comportamentos, gestos, olhares, toques e abraços. Sua alegria em ser um homem de Deus se manifestava na simplicidade de viver em igualdade com o povo — a melhor tradução do que significa ser imagem e semelhança do Criador.
Esse compromisso foi claramente visível em sua primeira viagem ao Brasil, durante a Jornada Mundial da Juventude, logo após assumir o papado. Em carro aberto, acolheu o povo com abraços e beijos. Recusou a proteção de uma “gaiola blindada” para estar entre aqueles a quem se propôs servir.
Assim, reformulou o discurso da Igreja, voltando-se para as questões contemporâneas — as dores e angústias do mundo real — em detrimento de um apego “cego” à tradição dogmática. Sempre com mensagens modernas e acolhedoras, convocava a todos (as) à santidade.
Corrigiu rumos, reconheceu falhas e reposicionou a Igreja no centro de debates mundiais: guerras, meio ambiente, violência, fome, sexualidade. E fez isso sem abandonar a espiritualidade, pois acreditava que viver a fé é também estar em contato com a realidade humana. E haveria forma melhor de espiritualidade do que aquela enraizada na vida cotidiana?
O maior exemplo, sem dúvida, é o próprio Cristo, que viveu entre os homens, compartilhou momentos com eles e se aproximou dos pobres, dos oprimidos e dos enfermos. Conheceu a bondade, mas também a traição e a maldade humanas.
Buscando seguir os passos da Trindade Santa, Francisco quebrou protocolos para servir. Visitou países devastados por guerras ou conflitos; entrou em nações muçulmanas, desceu às favelas, subiu os morros, adentrou casas simples, caminhou entre refugiados e presos esquecidos. Pregou a união e a paz. Defendeu o respeito às escolhas individuais, lembrando-nos de que, embora diferentes, somos todos irmãos em Cristo.
Costumava dizer que poderia ser um de nós — e assim procurava viver. Pagava suas contas, inclusive o cafezinho, ligava para pessoas comuns, falava com jornalistas com naturalidade e simplicidade. Para o bem, não foi como nós. Escolheu ser melhor. Serviu sem vaidade e deu-nos o exemplo de que todos podem ser melhores e viver em comunhão.
Francisco viveu intensamente a encarnação de Cristo. Serviu a todas e todos. Agora partiu — mas não em espírito, pois acreditava que nossa existência não se destina à morte. Ensinou-nos que a Páscoa é vida, e que dessa vida Deus quer que a humanidade ressuscite.
Assim viveu o Profeta de Deus: profundamente religioso; homem de oração, confiante no ser humano e, sobretudo, no ser supremo.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, ALMA – Academia Literária do Maranhão e AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.