por Osmar Gomes dos Santos
“Aqui não falta sol, aqui não falta chuva. A terra faz brotar qualquer semente. Se a mão de Deus protege e molha nosso chão, por que será que tá faltando pão?”. A letra é de Zezé Di Camargo e retrata muito bem a situação atual do nosso país.
O que acontece com a nação que a cada ano bate recordes de produção em alimentos, mas uma grande parcela da sua população ainda passa fome ou não tem acesso ao mínimo necessário para viver com dignidade?
Números recentes divulgados por vários institutos e entidades, com destaque para o IBGE, confirmam o aumento da pobreza no país. Embora tenha um peso relevante, a pandemia da covid-19 não pode ser considerada a única culpada.
Prefiro analisar a desigualdade e as consequências dela advindas por uma ótica estrutural. Não se pode querer cobrar desenvolvimento e progresso se as condições básicas, capazes de promover o bem-estar social, não estão presentes no seio da nação.
Nos primeiros anos do período de redemocratização, na década de 1990, o país assistiu à instituição de políticas de transferência de renda. Programas como Vale Gás, Bolsa Escola, Bolsa Família e o mais novo Auxílio Brasil são importantes, mas se mostraram pouco edificantes.
Antes de qualquer crítica dos apedrejadores de plantão, quero dizer que não sou contra qualquer programa de assistência social. No entanto, ele precisa ser temporário e transformador, possibilitando que cidadãos possam ser capazes de lutar pelo seu sustento. Em bom e popular português, é ensinar a pescar.
O que vemos, infelizmente, são gerações que se sucedem na extrema dependência do assistencialismo estatal. Ao primeiro sinal de crise e redução no valor repassado, instala-se o caos econômico visto na recente crise sanitária, com impactos nefastos no social.
Segundo os dados mais recentes do IBGE, o país tinha 13,5 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza, de acordo com critérios do Banco Mundial. Somadas aos que estão na linha da pobreza, o número corresponde a 25% da população do país, a maior parcela constituída de pretos ou pardos.
O fracasso em políticas emancipatórias reflete nos estados, a exemplo do nordeste, que quase metade da população vive abaixo da linha de pobreza e um grande número depende da transferência de renda.
O Maranhão, por exemplo, ampliou de 6 para 8 o número de municípios entre os 10 mais pobres do país. Entre os 100 nessa condição, o peso da participação maranhense também aumentou.
O Estado nordestino é, hoje, o que amarga a pior posição no quadro de renda per capita, com apenas R$ 676,00. Considere que estamos falando de média, o que denota termos milhares de famílias com renda por pessoa bem abaixo desse valor. Como não poderia deixar de ser, novamente, grande parte formada por pretos e pardos.
Vale destacar que pela dimensão territorial e fatores que interferem nas economias dos estados, não se pode pretender uma equidade na renda por habitante. Mas, pelo menos, é possível diminuir o abismo existentes entre os detentores das mais altas rendas daqueles que a cada novo estudo divulgado dão provas de que apenas subsistem.
A pobreza não apenas impede uma boa alimentação, como também prejudica o acesso a uma gama de serviços públicos, a exemplo da saúde, educação, cultura e lazer. Soma-se essa escassez à criação de crianças em ambientes com todo tipo de violência social.
Nesses espaços urbanos ou rurais, crianças que muitas vezes são privadas do essencial: a sala de aula. Crescem tendo que ganhar a vida nas ruas, agravando o problema da exploração do trabalho infantil, problema que diminui as perspectivas de oportunidades e agrava o vicioso círculo da pobreza.
Cada vez mais se faz necessária a consolidação de bases governamentais e parlamentares efetivamente comprometidas com a mudança desse quadro que assola o país. Nosso progresso enquanto nação depende dessa mudança de postura.
Agentes públicos, sejam eles federais, estaduais ou municipais precisam direcionar mais seus esforços para pessoas e menos para as propagandas institucionais, muitas das quais, embora importantes, “mascaram” graves problemas sociais.
A manutenção dos auxílios é importante? Não há dúvidas que sim. Mas em um país rico como o Brasil, urge encontrar caminhos que permitam romper, definitivamente, com o ciclo que condena crianças e jovens a um futuro de limitadas oportunidades.UMA PENA! É preciso ser mais gestor que divulgador de programas que ajudam na política mas cruelmente matam sonhos dos que mais necessitam. Isso se chama hipocrisia social.
*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.