Por Osmar Gomes dos Santos
O título desta semana reflete a impressão que tive ao assistir à série Adolescência, da Netflix. Os quatro episódios trazem uma trama focada na família Miller, que sofre uma guinada negativa de 360º quando o filho caçula, Jamie, de apenas 13 anos, é preso sob acusação de assassinar uma colega de escola.
Por óbvio, como dizem os mais novos, não darei spoilers sobre o desfecho da narrativa, a qual recomendo a todos os pais.
O enredo nos conduz a um mundo que, muitas vezes, passa despercebido por nós, pais, ainda que esteja diante de nossos olhos, sob o mesmo teto. O adolescente se isola em seu quarto e ali constrói um universo paralelo, que, apesar de fisicamente acessível, está longe do alcance de nossos olhares.
Aos poucos, esse espaço se torna cada vez mais inacessível, com barreiras erguidas para a família, mas com livre acesso a um mundo virtual repleto de perigos e armadilhas. Assim, os jovens permanecem conectados ao mundo, mas distantes dos seus laços familiares.
Ainda que haja uma repetição e um trocadilho, faz-se necessário dizer que a série provoca uma série de reflexões. Precisamos questionar o que leva essas crianças, ainda na puberdade, a adotarem determinados comportamentos. O que as conduz ao isolamento, à participação em desafios perigosos, ao bullying, a crimes graves e, em casos extremos, ao suicídio? Onde está o “elo perdido” entre a escolha por uma vida de plenitude e o abismo do isolamento? Podemos levantar diversas questões: até que ponto a negligência dos pais influencia esses problemas? Como as redes sociais afetam a formação da personalidade e moldam o comportamento dos jovens?
Muitas dessas respostas cabem a especialistas, mas me arrisco em uma análise superficial, com base nas experiências que a vida me proporcionou ao longo dos anos. Sem pretensão de ser taxativo, tampouco de me intrometer na vida alheia, acredito que muitas dessas respostas estão nos próprios pais, ainda que de forma inconsciente.
Primeiramente, é importante avaliar a arquitetura das casas, que, em muitos casos, possibilita a criação de “ilhas”, onde cada um se isola em seu quarto como se vivesse em um habitat paralelo.
A sala e a cozinha, antes espaços de convívio, tornaram-se meros locais de passagem. Os quartos possuem praticamente tudo o que os jovens precisam para permanecerem dias conectados à sua própria realidade: banheiro, computador, televisão e, claro, a chave para todo o resto, chamada smartphone.
Embora hiperconectados, eles se distanciam cada vez mais do universo familiar, transformando os encontros em exceções à regra da separação. Isso gera um vazio existencial e um abismo sombrio, sustentado por um mar de solidão sem fim.
Espaços pouco integrados fisicamente – somados à ausência de elementos que carregam histórias, como móveis antigos, porta-retratos, álbuns de fotografia e objetos decorativos afetivos – reforçam a distância entre as pessoas dentro do próprio lar.
Acrescente-se a isso o tempo sempre corrido, a falta de espaço na agenda para reuniões escolares, para conversas diárias, para acompanhar as diversas fases da vida dos filhos. Essas etapas estão repletas de desafios, superações e conquistas, e merecem ser celebradas.
Quando foi a sua última comemoração com seu filho? Pensou naquela festa de aniversário? Simples ou pomposa, custando milhares de reais ou apenas alguns trocados, a festa de aniversário é importante, porém, é apenas um detalhe diante de tudo que precisa ser cultivado. A relação entre pais e filhos não pode ser superficial, baseada em aparências ou compensada com bens materiais. Nada compra o tempo perdido, o sorriso que não floresceu, o abraço não dado ou o simples fato de estar presente.
Reserve um tempo diário para mandar uma mensagem, ligar, almoçar juntos. Comemore cada conquista, como se fosse o primeiro passo ou as primeiras palavras do seu filho. Ah, e sim, todos os dias temos motivos para comemorar.
Celebre a vitória do time da escola, as boas notas depois de tanto esforço. Vibre com cada detalhe que é importante para seu filho, mesmo que, para você, pareça insignificante. Lembre-se: seu filho tem suas próprias preferências e não é uma cópia sua.
Resignifique espaços. Transforme os almoços de sábado ou domingo em momentos em família. Faça da sala um verdadeiro espaço de lazer, propício para jogar, assistir a programas ou simplesmente jogar conversa fora e dar boas gargalhadas. Com um diálogo franco e aberto, estabeleça também limites. Toda criança precisa crescer compreendendo a diferença entre sim e não, bom e mau, permitido e proibido.
Encerro com uma história que penso resumir muito do que expus. Uma filha pergunta ao pai quanto ele ganha por hora. Ele estranha e reluta. Ela insiste. O pai responde: “Ganho cem reais por hora.” A menina pede cinquenta reais. Ele questiona se ela quer comprar brinquedos ou guloseimas e resiste novamente. Diante da insistência, o pai cede ao pedido. Então, a menina tira outra nota de igual valor do bolso. O pai, sem entender, apenas observa. Então, ela junta as notas e devolve ao pai, dizendo: “Aqui estão os cem reais. Saia uma hora mais cedo hoje e chegue em casa a tempo, porque hoje quero jantar com o senhor.”
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Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, ALMA – Academia Literária do Maranhão e AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.