*Por Osmar Gomes dos Santos
Era preferível que não existisse uma lei para fazer com que o outro enxergasse a mim como sou, com minhas particularidades biológicas dadas pela própria natureza humana, que nos fez não diferentes, mas complementares.
Sofro violências todos os dias: física, psicológica, moral, patrimonial, trabalhista, sexual, de gênero e tantas outras quanto for possível citar. Mas quero, neste particular, falar da dor que tem me aborrecido nos últimos meses: a maternidade e o trabalho.
Pesquisas e mais pesquisas demonstram que no mesmo ambiente de trabalho, nas mesmas posições hierárquicas, mulheres ainda ganham menos que os homens. Nem mesmo com lei, recentemente publicada, o cenário parece mudar substancialmente e as justificativas se acumulam, todas sem fundamento.
Uma delas, que aqui quero externar, é de que a maternidade atrapalha e retarda o crescimento profissional, deixando as mulheres para trás frente ao avanço dos homens rumo a uma carreira de sucesso. Enquanto a mãe é um peso, o pai – o homem, o líder, o alfa – recebe tapinhas nos ombros e segue sua trilha do triunfo.
Oras, mas a mulher tem filho sozinha? Devem ser delas, apenas, as responsabilidades com a gravidez, os cuidados neonatais, o pós-parto e a atenção nos primeiros meses e anos da vida dos filhos? Para que serviria um pai, afinal? Deveria eu, retoricamente, me perguntar.
Diferenciar mulheres e homens e estabelecer condutas discriminatórias das quais apenas o homem pode se beneficiar, não deveria ser um comportamento aceitável dentro da própria espécie. Deveríamos somar em vez de competir por espaços, posições, sucesso ou mesmo da tentativa, por vezes bem-sucedida, de diminuir as mulheres.
A sensibilidade não vem, nem deveria vir, de uma canetada e uma determinação no imperativo ao cumprimento no inteiro teor da norma. Mais do que direito, gostaria de ter o respeito daqueles que deveriam nos proteger, assim como uma mãe o protegeu sob sua saia por longos anos.
Isso mesmo! Aos que torcem o nariz para o “papo” de igualdade, deveriam lembrar que em vários momentos de suas vidas tinham uma mulher lhe carregando no ventre, protegendo-o das confusões de escola, lutando pela sua educação, lutando para livrar de caminhos tortuosos. Tudo isso dividido com uma jornada de trabalho extenuante para garantir o seu sustento.
De repente, crescem! O “sexo forte e viril” parece não mais precisar de nós, descartáveis, só que não. O tempo de aceitar esse rótulo de “termos o nosso lugar” – entre quatro paredes de uma cozinha – acabou e já não cabem às relações contemporâneas.
No entanto, com muita regularidade, ainda me deparo com o machismo incrustado em posturas, comportamentos, condutas de grande parcela da sociedade – e falo grande porque alguns já viraram a chave, um punhado têm se esforçado para se libertar da cultura na qual foram educados. Fato é que ainda vivemos sob o julgo do patriarcado.
Um machismo estrutural nas relações que ficam ainda mais evidentes no cotidiano do trabalho. A mulher tem TPM, menstrua, engravida. Volto a dizer, ela não faz isso só! Ademais, não há qualquer empecilho nessas fases que só nós, mulheres, temos o privilégio de passar. Eis a essência da vida, por alguma razão.
Não deveria advir daí quaisquer implicações, especialmente trabalhistas, uma vez que a gravidez não afeta sua capacidade laboral, talvez até aprimore. Da mesma forma, não deve haver implicação ao homem, não se trata disso. Não defendo qualquer posição retrógrada aos homens como forma de igualdade.
Contrariamente, falo de avanços para nós mulheres, para que estejamos no mesmo patamar e não sermos deixadas para trás, seja qual for o argumento. A gravidez é de todas e todos, tal qual devem ser a igualdade de salários, condições de trabalho, ocupação de espaços de poder.
Recentemente, tivemos mais um 8 de março e mais do que cafés, almoços, discursos, flores e homenagens em redes sociais, quero respeito! E não apenas nessa data, mas em todo o ano, em todos os espaços.
A igualdade não deve advir de mera promoção por força legal, embora, às vezes, seja preciso. Falo da igualdade como dever cívico, ético e moral. De sermos vistas sem o preconceito arraigado, sem rótulos. Apenas como somos, mulheres.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.