*Por Osmar Gomes dos Santos
Uma semana, duas situações, pessoas anônimas entram em ação, arriscam-se sem pensar em nada, o foco está apenas no outro, vidas são salvas. Esperança? Os acontecimentos mostram que ainda há humanidade em nós e que devemos deixar aflorar.
Nos escritos da semana passada falei sobre a Campanha da Fraternidade, que fala da amizade social. Nesta semana testemunhei dois acontecimentos que retratam bem a essência do que propõe a ação da Igreja Católica.
De repente, um barulho e uma aeronave caindo em mata fechada, mas próximo a residências. O bombeiro civil Fabricio e o empresário Adriano rapidamente se mobilizam para chegar ao local e iniciar os trabalhos de salvamento. Orquestraram um esquema de resgate que salvou a vida de sete pessoas, incluindo duas crianças.
O fato aconteceu em Barueri, São Paulo, e além de Fabrício e do Adriano, mobilizou outras dezenas de pessoas em uma corrente do bem. Uma verdadeira liga da Justiça, cada um com uma função definida ali mesmo e que resultou em um episódio que enche de orgulho o ser humano.
Vale destacar que a aeronave, já destruída na queda, apresentava focos de chamas e poderia incendiar e explodir a qualquer momento. Mesmo diante do perigo, lá estavam aqueles homens e mulheres, acreditando que era possível e comprovaram isso, apagando os focos com extintor e retirando as pessoas cuidadosamente.
Mais de 400km dali, já em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, o jovem Marcos se arriscou. Pendurado na porta de um ônibus, se desdobrava para alcançar um carro que estava para ser levado pela enxurrada. Dentro, duas crianças e uma mulher. No entorno, chuva e a água que não parava de subir, ganhando força a cada instante.
Temporal, correnteza, o tempo se esvaindo. Um pé na escada do ônibus, o outro no pneu do carro, a porta é aberta e o milagre que emana do coração humano acontece. Primeiro uma criança, depois a outra. Por fim, a sua mãe. Todas resgatadas e colocadas em segurança dentro do ônibus.
Em poucos segundos, o carro que já tinha água sobre o capô é arrastado pela correnteza, rumo a um paradeiro incerto, que poderia ter sido o roteiro de mais uma tragédia.
Em comum, atitudes que levam o ser humano a pensar primeiramente no próximo. No melhor lema fazer o bem sem ver a quem, uma afirmação de que reservamos algo de bom em nossa essência, apesar das desventuras que insistem em nos arrastar para o abismo.
O que leva alguém a arriscar a própria vida por quem nunca viu antes? Heróis sem capa, sem superpoderes, sem armas ou incrementos futuristas. Mas uma disposição e vontade hercúlea de ajudar o outro, de se doar, de apenas pensar em quem precisa e fazer o que parecia impossível.
Decerto que os exemplos são muitos e cada um de nós é um pouquinho herói quando escolhe fazer o bem, não importa quando e para quem. O que nos parece pouco, um simples gesto de generosidade ou um ato de bravura, para quem recebe significa muito. Nos dois casos narrados, pode-se dizer que significou o renascimento de vidas.
Edmund Burke, ainda que valha para um contexto geopolítico, teria afirmado que para o triunfo do mal, bastava que os bons nada fizessem. Para o Fabrício, o Adriano e o Marcos o triunfo foi do bem, frente às adversidades que cruzaram seus caminhos.
Dentre muitos acontecimentos na semana que ora encerra, esses dois episódios me tocaram de maneira a me encher de esperança. Aos pessimistas, a prova de que é possível acreditar em dias melhores, vivendo e praticando, todos os dias, a nossa amizade social.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.