Além dos desafios trazidos pelo momento que muitos insistem em chamar de “novo normal”, os quais alteraram rotinas de trabalho, estudos e a dinâmica social como um todo, ir ao mercado também tem se tornado um martírio para muitos pais e mães de família. Da mesma forma, aqueles que precisam encher o tanque dos seus carros, seja para se deslocar diariamente ao trabalho ou que os utilizam como instrumento laboral, sentem o peso de uma economia fragilizada.
Os R$ 50 já não “fazem uma feirinha” e os alimentos têm se alternado em disparadas sucessivas. Tampouco o referido valor é capaz de garantir dois ou três dias de deslocamento urbano para os que utilizam seus carros. Frente a constante elevação da inflação, a “onça-pintada” já não representa qualquer agressividade, lembrando apenas um pacato felino que repousa manso no verso da notinha marrom.
A alta dos preços dos combustíveis e dos alimentos vem apresentando como resultado um sucessivo aumento da inflação, tendo a de agosto a mais alta para o mês nos últimos quatro anos. Apesar da sazonalidade de alguns produtos, não há como negar o efeito da pandemia e da alta do dólar, que interfere diretamente no preço das commodities.
Para alguns itens, voltamos a viver o racionamento, com supermercados limitando a quantidade para compra. Exemplo mais emblemático nos últimos dias foi constatar, na cidade de São Paulo, o pacote de cinco quilos de arroz chegando a custar R$ 40 reais e donos de estabelecimentos precisando restringir o valioso item. “Os olhos da cara!”, como diriam os mais antigos.
Na esteira do aumento da cesta básica pegaram carona a cebola, o limão, a manga, a abobrinha, pescados, feijão, óleo, pimentão, leite, a carne. Apenas para citar alguns. No caso dos alimentos, a alta do dólar, como dito anteriormente, atrai produtores locais para negociar no mercado internacional, desabastecendo o mercado interno. Passa a valer a lei da oferta (baixa) e da procura (alta).
Além da cesta básica, o impacto da inflação tende a ser ainda maior e indireto em diversos produtos e serviços. Nos aluguéis de imóveis, por exemplo, o cálculo é reajustado considerando predominantemente o Índice Geral de Preços – Mercado, onde alimentação entra como base de cálculo, é utilizado para reajustar contratos de locação, além de outros relativos a prestação de serviços.
Não vou aqui me arriscar a aprofundar na ciência econômica, coisa que estudiosos da área fazem com destreza ímpar. Falo, porém, daquilo que sentimos na pele todos os dias, ao chegar no comércio ou no posto e constatar que o dinheiro, embora o mesmo de outrora, já possui valor diferente.
Não bastasse a pandemia, que resultou no fechamento de milhões de postos de trabalho em todo país e na perda do poder econômico para aqueles que continuaram com seus empregos, mas tiveram que se submeter a ajustes, o povo brasileiro se vê frente agora de outros desafios, que é a sobrevivência a partir do básico, que é o alimento.
O bom e velho arroz e feijão, prato típico do brasileiro e defendido por muitos nutricionistas como essenciais na manutenção de uma boa alimentação, já parece não ser para todos. Prova cabal de que algo no país não vai bem.
Quem diria que viveríamos para ver tantos fatores negativos em confluência, fazendo girar uma permanente roda gigante das incertezas. Ademais, cabe uma análise crítica ao tempo perdido com irresponsáveis caneladas, enquanto o país seguia a deriva em um mar revolto.
Medidas paliativas agora de pouco adiantam. Vender dólares, zerar alíquotas do arroz, notificar produtores em razão da alta. O Brasil precisa de mais ação e menos discursos, de mais interlocução e menos acirramento de ânimos, fazendo valer a máxima da harmonia dos poderes.
O Brasil parece caminhar para um futuro ainda incerto no que diz respeito à economia. Parece termos chegado à célebre forquilha na qual precisamos nos perguntar: para onde vamos? O que queremos enquanto nação? Qual rumo seguir? Não podemos permitir que viremos o “país das maravilhas”, no qual qualquer caminho é valido para ser seguido, uma vez que não se sabe o destino que se pretende chegar.
É necessário avançar! De um lado, enfrentar fortemente a doença que já vitimou mais de 130 mil brasileiros; do outro, precisa fazer o dever de casa para que o país volte a crescer. Obstáculos que somente serão vencidos tendo como base um pacto republicano para fazer a nação voltar aos trilhos do progresso.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.