*Por Osmar Gomes dos Santos
Avançamos 200 anos após o grito do Ipiranga. Um ato perpassado por gerações como heroico, representado no canto nacional como um brado forte de um povo. Mais do que uma manifestação de autonomia, o grito foi resultado de uma conjuntura política e econômica que já não sustentava o vínculo com Portugal.
Declarada em 7 de setembro, informação vista em qualquer livro de história, os fatores que levaram à independência já desenrolavam anos antes, com a vinda da família real para o Brasil (1808) e, mais adiante, o destaque para a chamada Revolução do Porto (1820).
Além-mar Portugal vivia uma crise, com a invasão pelas tropas napoleônicas. Somado ao fator do Brasil como refúgio, estão o aprofundamento da crise do sistema colonial, a efervescência dos ideais iluministas e, também, movimentos de independência que eclodiram nas américas Inglesa e Espanhola. Soma-se o interesse das elites agrárias.
A combinação de fatores promoveu uma conjuntura política insustentável, levando Dom João VI a abandonar o país, mas não sem antes “saquear” toda riqueza que poderia levar, deixando o novel país sem recursos. Ademais, quem por aqui ficou precisou enfrentar levantes sociais que resistiam à independência, vide a adesão tardia do Maranhão.
Convém lembrar que havia um acordo com Portugal, no qual o Brasil teria que pagar 2 milhões de libras esterlinas para ter sua independência. Com o cofre zerado, a solução foi recorrer à Inglaterra como financiadora do “projeto”.
Ora, mais o jovem estudante ao se deparar com essa realidade pode questionar: mas o que foi todo aquele movimento, e o grito? Bom, alguma história precisava ser contada nos livros como grandes feitos para a posteridade.
Não estou a questionar, tampouco maldizer os acontecimentos, mas apenas dando uma dose de constatação dos fatos. Não lutamos, não sangramos, não brigamos por terra, pelo direito de plantar, de edificar um país.
Isso, no entanto, não miniminiza o Brasil contemporâneo como nação, muito menos aqueles que aqui fincaram suas raízes. Essa constatação a faço quase que como uma provocação, para despertar o sentimento patriótico, sobre o qual ainda podemos e somos capazes de reescrever a história.
Uma nova caminhada na qual o Brasil seja efetivamente livre e autônomo, apesar do imperialismo globalizante no qual somos todos jogados e do qual não se pode fugir por completo. Mas que é possível trilhar com austeridade e independência.
Neste 7 de Setembro temos o que comemorar? Certamente que sim. Há avanços significativos em nossa história, assim como lições ainda a serem aprendidas e postas em prática.
Sobre a (in)dependência, enfatizo uma crítica de que não podemos falar de plena independência quando ainda somos subjugados lá fora. Quando aqui dentro ainda não fazemos o dever de casa, refletindo péssimos números nos mais diversos tipos de indicadores sociais e econômicos.
Em um projeto de país não cabem interesses escusos, acordos feitos às escuras e atos realizados à margem da lei. O significado de nação remete a região geográfica, a iguais, com objetivos comuns. O de Estado, remonta uma estrutura que trabalhara para o bem e a qualidade de vida desses comuns.
Dois conceitos simples que se, desde memorável 7 de Setembro de 1822, fosse tomado com seriedade, certamente teríamos hoje mais orgulho de nossa juvenil independência.
Lá se vão 200 anos. Acho que podemos dizer que chegamos à nossa maioridade nacional e, portanto, hora de paramos de agir como debutantes e assumirmos nossa autonomia frente ao mundo.
Precisamos aprender com os erros. Temos sucessivos eventos, notadamente no século passado, mas também recentes, de avanços e retrocessos, de conquistas e de perdas, especialmente nas liberdades, nas garantias de direitos fundamentais.
Comemoremos o 7 de Setembro, mas sem a utopia da independência plena, diante de irmãos nossos que vagam pelas ruas e habitam lugares inóspitos. Não enquanto ainda tivermos um único brasileiro na condição de miséria, hoje são 40 milhões. Brasileiros sem emprego, sem renda, sem comida na mesa.
*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.