*Por Osmar Gomes dos Santos
O título parece estranho, tanto quanto dizer que há uma ditadura da democracia ou uma democracia autoritária. Infelizmente as notícias que chegam do país vizinho nos remete a uma série de reflexões sobre o que governantes ao redor do globo pensam sobre democracia.
Uma palavra quase doce para os paladares mais exigentes das formas de governo que se tem notícia. Soa como uma boa música aos ouvidos mais aguçados, conhece e desperta um sentimento de liberdade único que somente ela pode assegurar. Mas de qual democracia estamos falando ultimamente? O caso da Venezuela acende o alerta da comunidade internacional para o perigo que determinados regimes trazem à essa forma de governo, que deveria ser, pelo menos, representativa.
O sinal de fumaça, inclusive, já tinha sido emitido meses antes. Mesmo adotando um discurso de abertura e transparência, a prática do governo bolivariano parece nunca ter tido a intenção de largar o poder. A inelegibilidade não devidamente explicada da principal adversária, seguida do impedimento de sua substituta direta em disputar o pleito, revela uma forma sórdida instituída por regimes ditatoriais de coagir, intimidar, desmobilizar, incriminar e evitar ascensão daqueles que representam uma proposta de alternância do poder.
Por fim, o terceiro candidato escolhido para concorrer teve cerceado o seu pleno direito a um pleito justo. Na véspera das eleições a tensão no ar foi revelada com a afirmação de que se o atual presidente não fosse reeleito, a Venezuela teria um banho de sangue. Afirmação retórica, óbvio, mas que serviu para dar o tom e intimidar aqueles que acreditam na mudança. O que se viu foi o povo nas ruas, exercendo o seu direito de votar, mas tendo usurpado o seu direito de conhecer o verdadeiro resultado.
Os mais diversos problemas e a não publicação das atas das urnas demonstram o quanto é obscuro o regime. Diga-se, os órgãos eleitorais, que se assemelham ao nosso TSE, são controlados por pessoas aliadas ao atual presidente. Aliás, todas as estruturas que deveriam servir à democracia, estão submetidas ao mandatário maior.
O acontecimento na Venezuela demostra um pouco daquilo que fora retratado na obra “Como as Democracias Morrem”, de Levitsky e Ziblatt, ainda que muito dessa reflexão recaia sobre governos tidos como de direita. Por analogia, a prática é a mesma: líderes que ascendem ao poder pela via democrática e que nela buscam se perpetuar aparelhando a estrutura estatal para assegurar sua permanência no poder, tendo como pano de fundo eleições montadas para legitimar uma “escolha”.
É preciso que se reaja a esse tipo de prática. As nações democráticas em torno do mundo precisam se levantar e defender o melhor regime de governo já pensado pelo homem. Se não perfeito, o único capaz de promover a mínima equidade que se deseja para a boa convivência.
Atribui-se a Winston Churchill a frase afirmativa que a democracia é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais. Na prática, depreende-se que ela não é perfeita, mas é o melhor modelo já arquitetado pelo homem para garantir que a política seja utilizada como ferramenta para a felicidade humana, como pretendeu o homem que iniciou o chamado período sistemático da filosofia antiga, Aristóteles.
*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.