*Por Osmar Gomes dos Santos
Mais uma vez, o presidente Donald Trump dispara sua metralhadora tarifária em um ataque contra países que não estejam alinhados às suas ações. Desta vez, a taxação foi dirigida às nações que compõem os BRICS e a alguns outros agregados.
A carta de Trump, cujo teor alcançou cerca de 20 países, atingiu em cheio o Brasil, com uma taxação de 50% a ser paga sobre os produtos brasileiros. Na prática, cada caixa de suco de laranja terá que pagar 50% do seu valor para entrar nos Estados Unidos.
Na carta endereçada ao Brasil, na minha particular análise, há duas inconsistências. A primeira – e óbvia – é o fato de que a balança comercial estaria favorável ao Brasil. A segunda refere-se ao fator político envolvendo um ex-presidente.
Quanto ao primeiro aspecto, o saldo em 2024 foi favorável aos norte-americanos, não se justificando, portanto, a adoção da medida. Destaca-se a relação comercial historicamente desproporcional: enquanto eles são nosso segundo parceiro comercial, somos, para eles, apenas o décimo sexto, correspondendo a cerca de 1,5% do comércio bilateral.
Em relação ao segundo fator, resta a dúvida: a finalidade não seria apenas criar um factoide, com o intuito de distorcer o real motivo da tarifação sobre outras nações? Isso porque não há qualquer base para a adoção de uma medida econômica tão drástica, motivada por um ingrediente meramente político.
Sob esse pano de fundo, soam estranhos os argumentos apresentados em duas laudas, inclusive pondo em xeque a atuação de instituições soberanas, para justificar a taxação de 50% a um país com o qual os Estados Unidos sempre mantiveram relações amistosas.
Onde há fumaça, há fogo. Ao que parece, há muito mais nos bastidores do que se pode imaginar.
Diante do cenário, e da taxação anunciada logo após a reunião dos países do BRICS, na qual diversas medidas foram adotadas e acordos firmados, a reação norte-americana parece buscar frear uma ameaça de médio e longo prazo. Ameaça que tem nome: China.
Há algum tempo, as políticas protecionistas implantadas pelos Estados Unidos, aceleradas no atual governo, buscam fazer frente ao crescimento chinês. Os BRICS representam uma fatia importante do mercado global. A título de exemplo, a China é hoje o maior parceiro comercial do Brasil.
A taxação é uma resposta clara àqueles que se alinharam aos chineses e que, para o governo Trump, representam uma ação direta contra os Estados Unidos.
Os próximos capítulos dessa novela, que se arrasta desde abril, prometem ser movimentados. Já a reciprocidade brasileira, como medida de retaliação, é outro ponto que precisa ser muito bem analisado, sob pena de engessamento de setores essenciais da nossa economia.
Além de encarecer sobremaneira produtos importantes na cadeia de comércio, suprimentos e serviços, a retaliação, como já anunciado por Trump, poderá gerar ainda mais sobretaxas.
Em meio aos obstáculos colocados ao entendimento mútuo, milhares de empresas e dezenas de milhares de empregos estão em jogo, especialmente no Brasil.
Estamos diante de um grande desafio diplomático, que deve superar as guerras de narrativas e ser tratado com a maturidade necessária à mesa de negociação, longe das frases de efeito ditas em perfis de redes sociais, em cartas ou em notas.
*Osmar Gomes dos Santos
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, ALMA – Academia Literária do Maranhão e AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.