*Por Osmar Gomes dos Santos
Corrupção é uma palavra que por si só já vem carregada de significados negativos, daquilo que o comportamento moral e ético abominam de pronto. É uma tragédia da alma humana que sobrepuja valores, relega princípios e enxerga ganhos tão somente a partir das práticas escusas.
Ela não está instalada apenas no seio da administração pública mundo afora, mas também nas relações sociais, no comportamento desvirtuado que busca aferir vantagem sobre outrem. Há sempre o “esperto” disposto a passar o “bobo” para trás.
Tal comportamento humano, por ele fabricado e aprimorado, pode ser visto em todo mundo, sem exceção. No entanto, há que se considerar a sua proporção e as suas consequências naquelas regiões – nações – em que a corrupção já se tornou um “câncer social”.
A tragédia vivida conjuntamente por Turquia e Síria, assistida pelo mundo inteiro, joga luz sob um grave problema que abala, literalmente, as estruturas de uma nação. Antes da pressa leve a questionar o que tem a ver a corrupção, o terremoto e as mortes, posso afirmar que, se não toda, há uma acentuada parcela de culpa.
Os dois países em questão são governados com punhos de aço por seus líderes. No primeiro, um presidente eleito que subverteu o jogo democrático para se manter no poder, sob o pano de fundo da legitimidade. No segundo caso, um ditador cuja família governa a nação desde 1970, estando ele próprio há mais de 20 anos à frente da Síria.
Não pretendo me referir especificamente à pobreza de Turquia e Síria, cujas rendas per capita são de 990 e 760 dólares, valor baixo para os padrões globais. Na contramão dessa limitada quantia anual, estão “representantes” que governam para si, ostentam uma fortuna e esbanjam com regalias dentro e fora dos seus limites geográficos.
Corrupção incrustada na estrutura estatal, visto no Índice de Percepção da Corrupção, mensurado pela Transparência Internacional. Ambos figuram entre as piores posições, estando a Síria à frente apenas da Somália.
O descaso das autoridades, somada à corrupção e a fenômenos naturais tendem a formar uma combinação perigosa, que em algum momento pode acarretar em tragédias sem precedentes. Foi o que ocorreu com esses países no terremoto recente, no qual mais de 30 mil pessoas perderam suas vidas.
A triste relação se acentua quando representantes do Estado Turco se veem envoltos a suspeitas de esquemas de corrupção.
Em relação aos prédios que desabaram, há uma série de indícios que remetem ao pagamento de propina para fazerem “vista grossa” para a péssima qualidade dos materiais empregados nas construções que ruíram com o tremor.
Soma-se a esse fato, a falta de ações de prevenção de catástrofes, algo não muito distante daquilo que vemos por aqui e que, inclusive, relatei há pouco sobre nossas tragédias igualmente anunciadas. A corrupção mata, a omissão mata, a falta de prevenção mata.
Essa constatação pode ser verificada em estudos recente dos sismólogos Nicholas Ambraseys e Roger Bilham, que analisaram vários casos, tais como Haiti, Nova Zelândia e Japão. Em síntese, as cidades mal preparadas tendem a sofrer mais com danos e sua população a chorar as perdas de pessoas.
Na prática, países onde o dinheiro público tem destinação contrária àquela do interesse público, os estragos são mais potencializados.
Hoje, já existe tecnologias para prever catástrofes, alertar antecipadamente e mitigar os impactos, como é possível verificar no Japão, por exemplo.
As causas para a corrupção são muitas, podendo variar de nação para nação, passando por questões políticas, educacionais e culturais. Fato é que ela constitui a maior ameaça à democracia e à vida. Resta-me, neste ponto, um dilema: o Estado de Direito é forte onde a sociedade é organizada, ou seria o contrário?
Penso que o Estado, aquele que avocou as rédeas da sociedade, regulamentando a vida, estabelecendo normas, garantindo direitos e fazendo cumprir deveres é, antes de tudo, o maior responsável. Deve ser o protetor da nação em todas as suas dimensões.
Aqui ou além-mar, de forma mais ou menos intensa ou escancarada, a corrupção potencializa desastres naturais, faz vítimas, ceifa vidas, deixa órfãos.
*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.