O hábito de bater palmas, tão comum em diversas situações do cotidiano, acompanha a humanidade a milhares de anos. Como muitas situações e comportamentos passados de geração em geração, não se tem como precisar a origem, tempo, espaço e circunstância em que essa manifestação humana passou a fazer parte de nossa conduta.
Estudos indicam que há pelo menos 3 mil anos esse ato constituía um gesto religioso, presente em alguns rituais com a finalidade de exaltar os deuses ditos pagãos. Tempos depois, o ato era praticado nos teatros gregos para invocar a proteção de seus deuses durante o espetáculo.
Nero, aquele que ateou fogo em Roma, teria dado contornos mais aprazíveis a este gesto, que passou a ser visto como sinal de aprovação. As claques, como eram conhecidos os grupos de “animadores”, ficavam dispersas em meio à multidão e tinham um objetivo único: inflamar positivamente com aplausos a multidão diante dos discursos do imperador.
O costume se espalhou e, com destaque para os teatros parisienses, pessoas passaram a ser contratadas para exercer uma função peculiar na plateia: aplaudir. Atualmente ainda é possível ver figuras similares em alguns programas de auditórios, responsáveis por puxar as palmas, os gritos e embalar a plateia para animar o espetáculo, dando ares de aprovação às programações.
O hábito evoluiu, ganhou outros contornos, e hoje, apesar dos poucos programas de TV, já não vemos os aplausos como um negócio. Está muito mais para uma manifestação espontânea, mas nem por isso desinteressada, posto que sempre há uma finalidade por trás do bater as palmas.
Está aí, por exemplo, uma explicação para a origem do nome, uma vez que palmas nada mais é do que o ato de bater uma palma da mão (singular) contra a outra (singular) formandos as palmas, sonorizadas em um harmônico plural.
Sua intensidade costuma ser proporcional a euforia causada pelo momento de emoção, seja ao testemunhar um grande espetáculo ou vivenciar uma situação. Em nossa rotina contemporânea ocidental, as palmas estão, costumeiramente, ligadas a acontecimentos positivos, mas nem em todo caso.
Utilizando-se do recurso para satirizar e metaforizar situações, batemos palmas quando, em tese, não deveríamos. Com boa dose de ironia, fazemos para reprovar atitudes de outrem, a partir das nossas crenças, do arcabouço cultural, sempre cheio de significados, que carregamos.
Assim, batemos palma para a pessoa ímproba , quando queremos, em verdade, atacá-la por seus desvios morais. O jogador aplaude o juiz após o lance que, na sua particular concepção, o árbitro se equivocou. Geralmente tais manifestações vêm acompanhadas de um irônico sorriso e, às vezes, de uma expressão de efeito afirmativa: muito bem! Parabéns! Para não dizer o contrário.
No cenário brasileiro atual, por exemplo, as palmas cabem perfeitamente às mais distintas situações alhures descritas. Em momento que mais de quinhentos mil perderam a vida, há quem reconhecidamente merecem as palmas de louvação; mas para aqueles que preferiram a via do fracasso, da negação da ciência, da politização, ficam as irônicas palmas de reprovação.
O certo é que as palmas representam uma prática social universal, capaz de contagiar e unir povos em uma linguagem corporal que basicamente tem o fim de aprovação. Costuma ser a expressão maior da alegria, da emoção. Pode se manifestar também diante de um ato triste, como a perda de alguém, oportunidade em que representará o reconhecimento de uma trajetória de vida.
O bater palmas revigora, permite uma renovação de ânimo, coloca para fora aquilo que se carrega, inclusive o que pode causar certa angústia. Por essa razão, ficamos mais leves e felizes ao realizar o gesto.
Há quem diga que há hora e momento para que as palmas vibrem e ecoem. Mas como conter a representação efusiva e quase desenfreada que determinados acontecimentos trazem às nossas vidas.
Bom que se diga que quem bate palma verdadeiramente não o faz apenas com as mãos, mas exorta a alma a saltar pelos olhos, gestos e sorrisos, aquilo que há de mais puro. Uma comunicação não-verbal que não precisa de qualquer verbalização para demonstrar sua grandeza de significado.
Frente a tantas intempéries, bom seria que vivêssemos em permanente êxtase. Que pudéssemos estar continuamente no modo automático e, cercados de tantos outros, quase que como num coletivo inconsciente, olhando-nos entre si, exortados a bater palmas.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras