A vida se perdeu sob nossos pés, meu amigo. O afastamento levou-nos para longe um do outro e uma pesada rotina se instalou, rompendo um ciclo material que costumávamos cultivar.
A amizade é um dos sentimentos mais nobres que podem surgir de nosso âmago. É divino, assim como dito nas sagradas escrituras. O que dizer daquele que por muitos é considerado o maior dos mandamentos, se não a essência da mais pura amizade? “Amem uns aos outros como eu os amei”, disse Jesus aos seus discípulos.
Segundo as escrituras, Jesus preferiu este novo mandamento em seus últimos momentos com seus discípulos. Em seguida, deu sua vida, bem maior pela humanidade, sinal maior de amor, que deve existir em toda e qualquer amizade.
Quero, pois, meu amigo, de forma também intimista, falar de amizade a ti. Amizade é aquela que só existe uma, nunca haverá a “falsa amizade”. Tal como a honestidade é qualidade única e integral de quem a tem, amizade não pode ser pela metade, ou, do contrário, ela já deixou de ser.
Vivemos um momento em que as amizades parecem nunca terem sido tão importantes em nossas vidas. Quantas não foram as festas canceladas, os chopps adiados, os cafés desmarcados? E nesse meio tempo, quantas não foram as amizades perdidas, como a tua, meu amigo.
Neste tributo a ti, quero expressar a dor da impossibilidade de tê-lo aqui comigo, meu amigo. Fostes rapidamente, de forma tão efêmera e efusiva que não pude te devolver aquele último sorriso.
Partiu quase que como um mal educado, sem dizer que estava de partida, tal como por diversas vezes que se ausentava de nossos olhos desapercebidamente, pois sabíamos todos que breve seria o espaço de tempo que nos permitira estarmos juntos novamente a compartilhar bons momentos.
Mas desta vez parece ter sido diferente. As horas passam, dias se sucedem, meses encerram e você não está mais aqui. Já não tenho esperança de vê-lo, nem mesmo quando este turbilhão de incertezas passar. Perdão, meu amigo, pois não pude dar-te o último abraço.
Gostaria que pudesse me ouvir, não sei se do outro plano essa conexão é possível. Quero poder, em prece, responder aquela mensagem que mandaste apenas para saber como eu estava, mas que a correria daquele dia, o mesmo em que você partiu, não me permiti fazê-lo. Talvez na esperança de que pudesse te ligar ao fim do expediente para ouvir sua voz, que já não ecoava neste plano.
De ti, guardo comigo os bons momentos. Como era bom poder conversar e ouvir as boas e francas palavras de conselho, mesmo quando eram elas duras, mas sempre verdadeiras. Que falta sinto de sua gargalhada sincera, do seu jeito simples, da sua capacidade de se dispor pelo outro.
Amigo, obrigado por ter existido. Perdoa-me por tantas oportunidades que tive de te falar isso quando estava ali, ao meu alcance, mas titubeei, endureci. Estou só agora, quieto em um canto escuro qualquer aqui dentro de mim, solitário, no único espaço em que ainda posso me permitir te encontrar.
Postumamente, digo que você é uma daquelas poucas escolhas que Deus me permitiu fazer para chamar de irmão, escolhido pelo coração para compartilhar momentos que ficariam escritos para posteridade.
Não sei se tarde, mas agora vejo o verdadeiro valor da amizade, cujo dinheiro ou bem algum, jamais, poderá comprar. Está fora de qualquer barganha e acima de qualquer compreensão, inclusive das mais racionais. Acho que Deus, quando inventou o amor, estabeleceu uma lei universal que não se poderia amar com a cabeça, daí nos deu um coração.
Não te tenho mais aqui, meu grande e valoroso amigo. Mas certamente tenho outros, talvez não tantos, mas amigos, como você. Peço que não te chateies, mas precisarei desviar um olhar mais atento a cada um deles, pois a lição da tua perda me ensinou que devemos ser mais atenciosos aos que vieram a este mundo para ser parte de nós.
Quero tomar as rédeas do sentimento, viver novos e bons momentos de amizade que se perderam por um curto espaço de tempo. Como nos versos de Vinícius, convidarei cada um para sentar ao lado, mirando-os nos olhos com o olhar antigo, sempre de maneira singular.
Contigo aprendi com a dor o valor da amizade. Um bicho igual a mim, humano, amigo. Um ser que a vida não explica. Quero agora me permitir correr para abraçar outros amigos, os que tenho e os que ainda terei, mas, como tributo a ti, sempre vendo em cada um a tua imagem e semelhança.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras