Para começar a prosa desta semana quero dizer que a sugestão do título nada mais é do que um recurso para torná-lo, digamos, mais atraente. Não no sentido apelativo, mas de forma que se torne mais próximo das práticas comunicacionais cotidianas.
Digo isso, porque costumo cultuar a ideia de que alguns conceitos construídos socialmente ou são ou não são, oito ou oitenta, no português claro. Ou se é honesto ou não; a amizade só pode ser verdadeira, caso contrário não é amizade. Há conceitos que não admitem meios-termos.
A democracia ou existe em sua plenitude, ou não estamos em um estado democrático, visto que não há democracia pela metade. É um regime de governo que implica no pleno exercício de direitos e no cumprimento de deveres, nem mais, nem menos. Ponto!
Quando se fala que a democracia passa por um processo de amadurecimento, de consolidação, não quer dizer que ela não está completa. Os preceitos insculpidos na Constituição de 1988 continuam válidos hoje, tais como eram quando da sua promulgação.
O que há, de forma permanente, é um processo natural de ajuste do estamento social, a partir das relações estabelecidas. É a expressão máxima daquilo que no Direito é tido como a criação ou ajuste dos atos normativos para atender as alterações próprias do comportamento da sociedade.
Assim, pode-se dizer que a democracia é algo que está em construção, em constante evolução, uma parede social sempre passível da colocação de um novo tijolo, a depender do amálgama social. Ainda assim, tal como está, funciona em sua plenitude, garantindo a proteção aos direitos individuais e coletivos, nunca pela metade, sempre de forma integral.
Neste processo de permanente construção, quero chamar atenção para o papel da imprensa livre. O momento é mais que oportuno, pois voltamos a viver, assim como nos tempos que antecedeu o regime de exceção, um cenário de total incerteza quanto ao futuro da nossa democracia.
Nesta segunda, 7 de junho, comemoramos o Dia da Liberdade de Imprensa. Não houve, em nossa história recente, nenhum momento tão propício para cerrar os punhos ao alto e bradar forte por nossa democracia. As liberdades individuais e coletivas, onde se inclui o direito de informar e opinar, estão em xeque.
Ataques ao trabalho de profissionais da imprensa têm sido vistos cada vez com mais frequência. Censura, desrespeito, ameaças, agressões, assassinatos. As selecionadas críticas à imprensa ultrapassaram a barreira do bom senso, dando lugar ao julgamento infundado, à intolerância.
Sou do partido de que quando não estou satisfeito com a linha editorial deste ou daquele veículo, simplesmente exerço meu direito de escolha. Mudo o canal, a frequência, os acessos aos partais de notícias e redes sociais. Troco de jornal ou de revista, simples assim.
Exerço meu senso crítico com sabedoria, equilíbrio e, sobretudo, respeito. Se não concordo, não preciso acompanhar determinada narrativa, mas devo respeitar, sempre, o direito de dizer, seja lá quem for. Não importa a linha editorial, a cor, a bandeira. O direito de opinião é livre, é de todos.
No alto das décadas de vida que acumulo, também não sou ingênuo a ponto de crer que existe total isenção no ato de comunicar de cada veículo. Este, por si só, só é executado com uma clara intenção de levar uma determinada mensagem ao destinatário.
Nenhuma mensagem é posta em um veículo, para ser levada via um canal junto a um determinado segmento sem uma real intenção de informar, de convencer, de fazer crer que o que ali está dito é uma verdade, devidamente apurada. Veículos criam uma relação de confiança com seus públicos justamente com base nessa premissa.
Isso não quer dizer, obviamente, que há um trabalho intencional e direcionado para construir mentiras. Faltar com a verdade no meio jornalístico é edificar a própria derrocada perante a opinião pública. Convém lembrar que a bases da democracia são os direitos e deveres, inclusive com a verdade e que alcança a todos.
Ademais, a imprensa não está para agradar este ou aquele sujeito, destinatário da mensagem. Antes de tudo, a imprensa existe para informar, tendo o dever de fazê-lo com a veracidade dos fatos. Fazer transitar narrativas que refletem a realidade social é o compromisso primeiro que a imprensa deve assumir, daí porque a sua plena liberdade deve ser respeitada.
O momento é de se posicionar, de lutar contra a intolerância e o negacionismo. Uma imprensa fiscalizada, controlada e amordaçada não interessa a uma nação livre, que constrói suas práticas discursivas em grande parte por meio da própria imprensa.
Na construção do sentido, a partir das narrativas sociais, o único e aceitável controle sobre a imprensa é aquele advindo do próprio tecido social. Cabe somente à sociedade, em última análise, a crítica, a acreditação e a seleção, natural, daqueles veículos que vão ou não continuar a missão de informar.
Viva a imprensa livre, fortalecedora de nossa democracia. Mas não se faz imprensa sem pessoas, sem profissionais que atuam vinte e quatro horas para levar os fatos a cada casa. Parabéns aos profissionais da imprensa, vale lembrar, que atuam na linha de frente da pandemia para cumprir o dever de bem informar. Liberdade a ti, hoje, amanhã e sempre.
Que este Sete de Junho, seja para a imprensa o que o Sete de Setembro é para a nação, servindo como caixa de reverberação para que o grito da liberdade ecoe ainda mais longe.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras