Na política, no esporte, na guerra ou na vida é preciso reconhecer uma derrota. Jogar a toalha, hastear a bandeira branca ou simplesmente se recolher na dor da derrota, juntar os cacos, como popularmente se costuma dizer, e sair de cena.
A falta de humildade para alguns, no entanto, faz com que se perca toda e qualquer dignidade e honradez diante da derrota. Um pleito, seja ele qual for, deve ser encarado como uma disputa entre adversários, jamais como inimigos. Ademais, a disputa, principalmente quando esta se dá no jogo da política, constitui a expressão maior da democracia.
Torna-se ainda mais deprimente e melancólica a derrota sucedida de ataques à moral, à honra, à integridade daquele que saíra vitorioso. Principalmente quando o derrotado outrora posava impávido no arauto da arrogância.
Do outro lado, não perde tempo em apontar o dedo e cobrar, exigir, criticar. Sem qualquer senso raso de coerência, se coloca a avaliar aquilo que ainda sequer pode ser questionado. Ao apontar um dedo e cobrar ações em um mês, esquece-se da lei reversa, voltando-se para si próprio quatro outros dedos, cada um deles com a marca indelével da omissão, da inoperância e má gestão.
Que autoridade pode ter o derrotado? Com que moral e direito se reveste dos melhores valores e intenções, que noutro momento, quando tivera oportunidade, nada fizera? Obviamente não se deve pisar no derrotado. Ao contrário, após uma disputa, seja qual for a posição que dela saia, é oportuno agradecer o bom combate.
Além disso, quanto ao cenário político, essa seria, inclusive, uma posição de respeito com o eleitor, que é quem decide o resultado do jogo democrático. Achincalhar, difamar, caluniar o vencedor é pisotear do povo, dos cidadãos comuns, que se puseram a participar do sufrágio, mesmo frente a Covid-19, este sim, um inimigo de todos.
Faço uma analogia ao ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que após a luta pela disputa da Casa, usou a palavra não para atacar, mas para unificar. Alguns extremos aqui, temperatura que se eleva ali, ânimos exaltados acolá. Esses são comportamentos que, embora questionáveis, podem se fazer presente na disputa. Porém, jamais, após passado o calor do jogo.
Parafraseando a letra da música de um artista contemporâneo, “não se pode esperar que a vida seja feita de ilusão, sob pena de morrer na solidão, é preciso saber perder”.
A política, seja ela em qualquer âmbito de nossas vidas, pois somo seres políticos, exige coerência. A população, diferentemente do que pregam algumas teorias ultrapassadas, tem memória. Atitudes como estas já jogaram dezenas, milhares, de personalidades no ostracismo político, sem terem deixado qualquer legado. A não ser aquele robusto, que será gozado pelos herdeiros do “patrimônio”.
Entendo ser uma postura inaceitável, principalmente diante da conduta respeitosa daquele que sai vencedor da disputa e não tripudia da derrota alheia. Nesse ponto em particular, recordo-me daqueles fatídicos 7 x 1 aplicados pela Alemanha sobre a Seleção Brasileira. Apesar da acachapante derrota, sentida por milhões, não passamos a odiar os alemães, talvez até admirá-los, pois venceram de forma honrada e respeitaram a grandeza do adversário durante e depois da partida.
Lidar com o resultado, seja ele qual for, vitória ou derrota, é o que diferencia os grandes dos medíocres. Quando o perdedor enxerga a pessoa vitoriosa como inimiga, aquela que deve ser execrada, eliminada, perde uma grande oportunidade de realizar um autoexame de consciência que pode contribuir para o autoconhecimento. Deixa-se escapar, como água por entre os dedos, uma preciosa oportunidade de evoluir enquanto ser.
Embora o apego à coisa pública, tomada como própria, ainda possa pesar, é preciso entender que nesta vida tudo é apenas uma passagem, inclusive a ocupação em uma posição, seja ela pública ou privada. Aceitar que nada é eterno e que tudo muda conforme a conjuntura que se apresenta, talvez seja o caminho mais prudente a ser tomado.
Recentemente, em uma aparição pública, o filósofo Francisco Bosco disse que há casos nos quais a pessoa derrotada não sabe lidar com a perda. Com isso, acredita pode se fortalecer ao atacar o oponente, na vã tentativa de, em dado momento, posar como “o salvador”, o baluarte da moral e bons costumes.
Todavia, é de bom alvitre lembrar que o leite já fora derramado e que não se pode retomar uma posição que não fora devidamente honrada no momento oportuno. Na passarela, tal como uma escola de samba, a vida pede passagem e desfila suavemente. Como a plateia, o povo canta, vibra, elogia, debate e decide.
Antes de apontar o dedo, lembre-se que na política há pelo menos três julgamentos possíveis de se enfrentar: o popular, nas urnas; o Divino, com cada um dentro de sua crença e religião; e há aqueles dos poderes constituídos, fazendo pesar a espada da Justiça. Mas do que nunca, na política, o ditado “a Justiça tarda, mas não falha”, há de prevalecer. E para muitos, pelo menos um desses fardos, há de tirar o sono. Um conselho: Melhor se recolher.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.