O mundo continua a observar o Brasil com olhos de desconfiança. O país saiu atrás no controle da Covid-19, o governo demorou a levar a sério a doença, valores destinados para assistência médica e hospitalar foram desviados de cofres públicos em escândalos que se sucederam é ainda se sucedem país afora. Por outro lado, grande parte da população ainda insiste em ignorar as medidas preventivas e promovem encontros e festas, que causam aglomeração e espalha o vírus.
Em meio a esse cenário caótico o governo federal parece dar cada vez menos sinais de que está próximo de uma solução para a Covid-19 no país. Recentemente exaltamos a luta travada por cientistas para produzir, em tempo recorde, o antídoto contra a doença que já fez milhões de vítimas em todo o mundo. A ciência foi festejada e aplaudida de pé, pois tínhamos uma possibilidade de cura poucos meses após o surgimento do vírus.
Passadas algumas semanas da comprovação da eficácia da vacina, o Brasil permanece inerte na linha de largada. Enquanto nações de todo planeta, com destaque para a ação conjunta da União Europeia, adotavam medidas para aquisição de milhões de doses e o planejamento de campanhas para imunizar a população, ficamos perdidos em meio a debates infrutíferos, muitos deles travados pela mera vaidade política.
Disputas que em nada levaram, muitas delas ainda sendo travadas em um plano de “imbecialidade”, onde quem perde é a população. Há algum tempo venho defendendo que a nação precisa de um debate maduro, independente de lados ou ideologias. Há tempos defendo que o Brasil necessita de um pacto republicano, sob pena de ver ruir suas estruturas e sua confiabilidade perante o resto do mundo, o que prejudica diretamente o seu desenvolvimento.
No tocante à vacina, caneladas após caneladas nos fazem regressar à estaca zero, um ponto de partida do qual, ao que tudo indica, permanecemos estagnados. Ao passo que outras nações não só já adquiriram e já aplicaram milhões de doses em seus cidadãos, o Brasil segue sem ação concreta, a não ser algumas isoladas, adotadas de forma independente por alguns estados, mas que esbarram na tal aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa.
Nada justifica a posição de quase inércia em que nos encontramos. O Brasil foi um dos países mais castigados pela Covid-19 e ainda sofre com um alto número de infecções e mortes diárias, 200 mil óbitos em números absolutos.
Um quadro que por si só exige medidas enérgicas e eficientes por parte do mandatário mor. Tudo de forma antecipada, a exemplo do estabelecimento de parcerias com diversos laboratórios e não apenas um. Mas não. Nenhuma medida que pudesse desburocratizar os processos de aquisição da vacina e de seus insumos necessários à aplicação. Nada! Mesmo com tecnologia sendo desenvolvida em nosso quintal, no caso Butantan e Fiocruz.
É preciso ir além dos discursos, seja nas redes sociais ou em cadeia nacional. Prometer resultados sem apresentar um caminho estrutural, sem demonstrar ações concretas, soa como engodo aos ouvidos até mesmo daqueles menos atentos. Afirmar a entrega de milhões de doses, sem que tenha sido, até o momento, efetivamente adquirida sequer uma dose, parece querer subestimar a inteligência do brasileiro.
O plano de vacinação, por parte do Ministério da Saúde, apenas saiu depois da judicialização e, ainda assim, continua sem seu principal objeto: a vacina. A latente falta de diálogo do governo federal com os estados a fim de desenvolver ações conjuntas e preparar a nação para a vacinação, compromete as chances de uma campanha bem sucedida. Continuamos sem rumo, navegando por um mar de incertezas.
Diferentemente das naus que partiam da Europa e aqui aportavam na época da colonização, a Nau Brasil parece seguir sem rumo. A semelhança é que em ambos os casos, as doenças que se proliferaram durante a travessia não permitia saber qual a contagem de mortos no destino. Outro ponto comum é que, para a tripulação de outrora, hoje também pouco parece importar à tripulação “mor” quantas serão as covas que ainda precisarão ser cavadas.
O tempo urge, a economia encolhe, a população agoniza, sufocada na falta de esperança. A única certeza que ainda podemos ter é que tudo que resta são incertezas. Planos, estudos, trabalhos, viagens. Nada! Resta um horizonte obscuro de medo, de uma estrada que não se pode afirmar onde vai dar e, tampouco, sabemos como caminhar.
Apesar da conjuntura em que nos encontramos, prefiro tentar olhar o copo meio cheio. Vivemos um cenário que, infelizmente, precisamos utilizar um ditado popular como máxima: antes tarde do que nunca. Que venha, ainda que com atraso. Espera-se que os embates sejam superados em tempo e que a gota de esperança possa chegar a toda população.
O barco segue à deriva. É hora de ajustar a bússola, tomar o leme com mãos sábias e rumar a um destino seguro para toda nação.
Osmar Gomes dos Santos, Juiz de Direito da Comarca da Iha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.